Foi acontecido e passado no último domingo. Na minha idade, como tantos e tantos, passei meu domingo órfão de mãe. Minhas filhas e filhos se reuniram ao redor de sua mãe, ou melhor, avó, porque temos mais netos que filhos. Fizeram a festa em um excelente restaurante, enquanto eu lhes havia sugerido o almoço ali na fazenda, mesa e comida pobre, porém só nós com nós. Mas tudo bem, mães e pais idosos amam essas festas com filhos e netos. É este o antepasto da morte que lhes vem chegando – às vezes por traição imprevista dos anos ou doenças. Nossa obrigação é festejar com alegria, pois nunca se sabe se esta será a última. E é bom que a saudade futura seja mesmo cantada e colorida.
Não gosto de festa familiar em restaurante, limitada a quatro ou cinco que estão ao redor, quando a família tem vinte ou trinta participantes. Por ter vivido tanto, participei de todas as espécies e variedades de reuniões familiares. Tive irmãos inimigos que se abraçaram no aniversário do pai e sinto aqui dentro um aperto de coração quando minha dona Elvira mãe decidiu que era sua hora de morrer. A intimidade familiar nessas horas fica pressionada, mais que em qualquer dia de festa. Eu me lembro, desculpem-me os leitores de sofrimento, da agonia de minha mãe, acontecida suave e macia na sua cama e casa, em tempo da nossa morada na praça. Ela, na cama vasta do casal, agonizando vagarosa e consciente; seu olhar já saudoso percorrendo os filhos todos ao seu redor. Cada um oferecia uma coisa, uma água, um doce, um carinho. Meu padrinho José Humberto, o mago da nossa medicina, assentado na cabeceira, apenas lhe afagava com lágrimas os cabelos. Eu, jovem aprendiz, peguei o violão e tive a coragem de dedilhar e cantar-lhe baixinho uma balada que tanto amava... “era o meu lindo jangadeiro, de olhos verdes da cor do mar... também como ele traiçoeiro, mentiu-me tanto o seu olhar... Mamãe cerrou suavemente os olhos, apertou-me a mão... e foi-se encontrar com meu pai jangadeiro. Tudo suave, nenhum gesto histérico ou choro de fantasia.
Muitos anos depois, cantei meu violão para o José Humberto... Agora, sinto que devo treinar o João Luiz para o meu dia, que sinto e até me avisam estar despontando... Afinal, passei os oitenta anos e sou médico, entendo bem dessas expectativas, interesses e preocupações. Meus colegas de idade sabem e entendem este mundo mais jovem, alguns até sofrem sem razão. Afinal, no dia e depois da morte, as coisas se arrumarão como Deus queira – às vezes muito diferente do que outros sonham ou querem.
Enquanto isso e por tudo isso, vejo, assisto e participo com carinho do Dia das Mães, porém sem explosões. Que tenham sido felizes não pelo dia de festas, mas sim pelo amor dos que as cercam. É o que vale.
(*) Médico e pecuarista