ARTICULISTAS

O fim do mundo

No tempo em que o rádio reinava absoluto

Mário Salvador
mariosalvador@terra.com.br
Publicado em 11/12/2012 às 19:23Atualizado em 19/12/2022 às 15:51
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No tempo em que o rádio reinava absoluto nos lares brasileiros – o que já faz um tempão –, o povo se divertia com brincadeiras até ingênuas. E como neste mês há uma perspectiva de o mundo virar pó no dia 21, conforme as previsões, lembrei-me de uma dessas brincadeiras sobre o fim do mundo, repetida à exaustão há uns setenta anos. Numa roda de amigos, algum sabichão comentava: “Se houvesse um desastre, morresse todo mundo, menos eu, eu iria montar um enorme armazém, para vender de tudo.” De repente um gaiato colocava o pé na peia: “Mas para vender para quem?” Então, vinha o mic “Para um bobo como você!” Com o tempo, a brincadeira foi se desgastando normalmente: os bobos foram ficando espertos...

Ninguém daria crédito a uma brincadeira como essa hoje. E a julgar pelo tamanho da fila para concorrer à Mega da Virada, ninguém tem dado crédito nem ao fim do mundo, que acontecerá no próximo dia 21. Ninguém mais faz papel de bobo. Aliás, hoje tudo é repensado, analisado, criticado.

É o que tem acontecido aos fatos, bem como aos provérbios, aos pensamentos, às expressões populares... Não há o que não passe por um repensar, uma releitura. Surgem especialmente interpretações jocosas do que durante anos vínhamos aceitando como definitivo. Afinal, “Rindo, corrigem-se os costumes.”, já dizia a fórmula latina.

Até o provérbio “Quem ri por último... ri melhor.” ganhou novo enfoque: “Quem ri por último... é retardatário.” Ou, mais criticamente: “Quem ri por último... não entendeu a piada!”

Também andaram fazendo uma releitura daquelas conhecidíssimas tarefas a serem realizadas em vida: “Todo homem deve ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro.” Na verdade, o difícil não é ter, mas criar o filho, mesmo quando os problemas não vão além dos previstos: alimentar, educar, orientar na escolha de um bom caminho e de uma profissão, orientar para não usar drogas e para seguir as leis...  Regar sempre a árvore que foi plantada pode ser tarefa bem menos complicada que criar um filho. Caso não falte água. Já escrever um livro é serviço dos mais sofisticados. Há quem escreva muitos. Atrelada a esta, ainda há a complicada tarefa de arranjar leitores. Complicada, a julgar por nossas ações. Devoramos certos livros numa sentada. Já outros, temos vontade de os abandonar logo na leitura das primeiras páginas.

Fazendo a reescrita das tarefas, “O homem deve ter um filho e bem educá-lo para a vida em sociedade; plantar uma árvore e cuidar dela, para que dê sombra e ou bons frutos, e escrever um livro cuja leitura seja prazerosa.”

Enquanto o fim do mundo não chega, há tempo de repensarmos muitas outras ideias. Reflexões sempre surgem quando imaginamos estar perto de algum fim... E já que não podemos mudar a data do fim do mundo, podemos ao menos mudar nossa maneira de vê-lo, acompanhando os novos tempos. E, por garantia, custa-nos pouco fazer uma fezinha na Mega da Virada… Ou alguém vai economizar para comprar naquele armazém do sabichão?

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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