... já chegou! Caramba, eu ainda não acabei aquela colônia estrangeira, presente do ano passado! E a camisa New York, que fiquei guardando para usar em ocasião especial e exibida? E a irmã Ziza, que eu queria visitar, fui adiando, morreu antes!... quanta coisa aconteceu, e eu não vi o tempo passar... e de novo o som de gingobel nas ruas, as luzinhas que eram mil e agora parecem ser milhões? E o Feliz Natal tocado pelos sinos, cantado pelas crianças na televisão, os olhos brilhand que será que eu vou ganhar de presente?... É. O Natal chegou, ponto. A gente e eu junto, pensamos: puxa, mais um ano!
Foi depressa demais, eu nem me lembro dos projetos que fiz no passado, enquanto a festa chegava, a família se reunia, a gente enfeitava e cantava e rezava no presépio de mil luzinhas... Deus é bom, eu também quero, olha, eu agradeço tudo e todos, desculpa, Pai, desta vez eu vou mesmo ser melhor, esquecer de quem não gosto, lembrar de todos que gosto, mais ainda dos esquecidos que nem sei se ainda estarão no ano que vem... Noite Feliz, eu canto lá por dentro, afinal estou aqui de novo e vivo, posso cantar, celebrar, rezar até... A capainha do portão toca, é aquele coitado pobre abandonado que vem pedir um prato de comida... chato, isto virou rotina, é toda noite, será que ele nunca vai trabalhar?
O Claudio prepara aquela sobra, prato descartável, tudo ficará lá fora, ele mesmo vai colocar na sacolinha e no lixo... ou quem sabe vai levar pra casa, quem sabe tem companheira ou filhinho pra dividir... Uma dorzinha de remorso me acode, eu nem sei o nome dele! Quem ele é, de fato e de verdade, se ele existe mesmo... ou foi Deus que mandou esta encomenda, só de lembrança que tantos existem assim, batendo em nossas portas e natais?... a dorzinha doe, porque aí apenas eu vejo os meus chegando, nós todos com as feridas de mágoas e necessidades da vida, sofrendo o que passou e esquecendo o Roberto Carlos... o que chorei ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi!
As capainhas das portas podem tocar, meus amigos, lá fora estarão os sem Natais, ou aqueles para quem este Natal não mais é festa, pelo que perderam, sofreram e lembrarão na beira dos presépios existenciais. Desculpem-me, amigos que me leem. Esta crônica não era para ser triste, mas saiu assim mesmo. Acontece que vivi muito, talvez demais, sinto as saudades naturais dos anos passados, de todos os Natais que vi e vivi. Na noite que está chegando, vou novamente pegar meu violão, frente ao presépio, minha gente vai cantar Noite Feliz, nós vamos nos abraçar uma vez mais e ler São Lucas contar a história do Menino que nasceu, peladinho e esquentado a bafo de boi naquela gruta pobre de Belém.
O final é cantar mesmo a beleza de ter e continuar esperando com alegria o nosso próprio e último Natal. O Menino quer isto, tenho certeza: FELIZ NATAL!
(*) médico e pecuarista