Meu amigo, Juvenal, era assim que eu o chamava. Comecei a escrever um artigo sobre você. Já falaram sobre seus livros, seus títulos, seus méritos. Pouca gente sabe que você era membro da “International Society for Metaphysics”. Já escreveram sobre suas aulas, suas atividades de magistério e ministério. Pensei em tudo isto e sobre tudo no que você fez de marcante em sua caminhada. Que me resta? Resta-me o mais importante. Vou falar sobre o amigo. Não me envergonho de dizer que estou chorando enquanto escrevo. Você foi embora, foi conhecer de perto Aquele pelo qual você deu sua vida, sua luta, seu suor, suas alegrias e seus sofrimentos. Você foi embora deixando saudades, um vazio estranho e sem respostas. Saudades. Lembro-me da história daquela criança de 8 anos que, ao comentar para o médico sobre sua morte, sabia que estava com câncer. Tomando a mão do médico, disse tranquila: “Minha mãe vai ficar com saudades, mas saudade é o amor que fica”.
Juvenal, você foi embora, mas o amor ficou. Lembro-me de quando o conheci, em fevereiro de 1935. Eu estava com 12 anos, você com 15. Dois adolescentes que pensavam em ser padres. Estudávamos no Diocesano. Você era sempre o primeiro de sua classe. Eu me orgulhava de ser amigo, daquele rapazote espigado e centro-médio de nosso time de futebol. Fomos companheiros de estudos em Uberaba e, posteriormente em Belo Horizonte.
Ordenados padres, viemos para o Seminário de Uberaba. Você como Reitor, eu como professor. Vivemos anos e anos trabalhando juntos. Havia naquele tempo uma organização de apostolado, a Ação Católica. Você era assistente da JUC (Juventude Universitária Católica). Eu assistente da JEC (Juventude Estudantil Católica). Você, mais velho, mais experimentado, mais ajuizado, muito mais culto, era mais um orientador meu do que um amigo. Lembro-me de um fato. Quando Leonardo Boff era perseguido por um famoso cardeal da época, nós nos revoltamos contra tanta iniquidade. Escrevi um artigo violentíssimo e dei para você ler. Você leu e aconselhou: “Prata, tudo isso é verdade, mas não publique. Dom Benedito vai ficar magoado com você. Ele é nosso amigo e não tem culpa do que acontece lá em Roma”. Era naquele tempo em que a Teologia da Libertação trazia um sopro de superação para os pobres. Era uma Teologia que partia do Povo e lutava para que os bens fossem distribuídos de maneira mais justa. Era o tempo das “Comunidades Eclesiais de Base”. Os leigos tomavam consciência de seus direitos e de sua força renovadora. Éramos chamados de comunistas. Foi uma época difícil. Respondemos a um humilhante Inquérito Policial Militar. Você perdeu sua cadeira de Antropologia na Faculdade, mas continuou fiel a seus princípios. Escreveu um livro sobre o assunto tão polêmico.
Juvenal, sua partida me fez sofrer muito. Estou também muito perto para a Casa do Pai. Você deixou-me um exemplo de padre, de homem, de sensatez, de amor ao pobre, de fidelidade aos amigos e a seus princípios. Juvenal, meu amigo, até breve.
Saudade é o amor que fica.
(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro