Hoje vou sair da crônica para contar estórias de crianças e de adultos. São estórias que realmente aconteceram. Dou testemunho.
1. Pela primeira vez, minha sobrinha Malu, com seus quatro aninhos, entra numa igreja. Fica espantada diante da imagem de Jesus Crucificado. Chama sua tia Fernanda e pergunta: “Tia, por que bateram tanto naquele homem só de cuecas? Está todo cheio de sangue e machucado. Por quê, tia?
Coitadinho dele!”
2. Outra sobrinha, Sophia, da mesma idade, com a mesma tia, olha uma pintura numa igreja e pergunta: “Tia, por que aqueles meninos de asas, voando lá em cima, estão todos pelados?”
3. Havia na Catedral, anos atrás, uma imagem do Anjo Gabriel pisando no pescoço de Satanás e enfiando-lhe uma lança no coração. Diante da imagem um garoto de uns seis anos olhava, sem entender, aquela luta. Ao me ver passar, me chamou e perguntou: “Moço, por que esse homem vestido de borboleta, está matando esse morcego de rabo e asa preta?
4. Em 1987, quando fui nomeado Pároco da Catedral, procurei reduzir o número de imagens nos altares laterais. Era um santoral de assustar. Alguns daqueles santos eu nem sabia o nome. Um deles era uma freira toda vestida de negro, somente o rosto ficava à mostra. Alem disso, era feia. Tirei-a de lá e guardei-a num dos armários da sacristia. No dia seguinte, uma senhora me procurou, bastante revoltada e apresentou suas razões: “Aquela imagem que o sr. retirou era de Santa Madre Cabrini. Foi ela que curou meu filho atropelado por um caminhão. Estava cumprindo uma promessa. Não admito o que o sr. fez. Gostaria que ela voltasse para seu lugar”. Bem, para não piorar as coisas, a “santa” voltou para seu pedestal de honra.
5. Casal apareceu com uma filha para batizar. Perguntei pelo nome da criança. “Ela vai ser batizada com o nome de Odalisca”. Assustei com aquele nome e respondi: “Minha filha, esse nome não é muito adequado, não tem sentido cristão. Vamos escolher um outro?” “Não, senhor. Já escolhemos, achamos bonito e vai ser esse mesmo”. Fui ao meu escritório, trouxe um dicionário de português, abri no verbete “odalisca” e pedi que ela lesse. Dizia mais ou menos o seguinte: “Esposa dos sultões árabes. Meretriz. Prostituta. (Chul p...”). Olharam um para o outro. Conversaram baixinho e sugeriram: “Seo Padre, é melhor mesmo trocar. O sr. já pensou nossa filha com um nome desse? Resolvemos mudar para Mariana. O sr. concorda?”
(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro