ARTICULISTAS

O que passou passou

No fim da semana passada, vi, pela TV

Padre Prata
thprata@terra.com.br
Publicado em 30/06/2013 às 14:07Atualizado em 19/12/2022 às 12:15
Compartilhar

No fim da semana passada, vi, pela TV, o protesto que assaltou as ruas de algumas de nossas cidades. Comentaristas explicavam que os jovens se revoltavam não contra os vinte centavos das passagens dos ônibus. Aquele desespero era provocado por um governo corrupto, pelas deficiências na segurança, na educação, na saúde do povo, pelos bilhões de reais gastos em construir estádios faraônicos. Maracutaias do poder.      Não sei por que meus velhos neurônios me fizeram sonhar, naquela noite, com episódios de minha infância. Ser adulto é muito ruim. Bom mesmo é ser criança. Elas têm o coração puro e não trapaceiam.

Sonhos são sonhos, mas alguns deles nos trazem lembranças e com as lembranças um gosto de coisas perdidas e jamais recuperadas. Como seria feliz se pudesse voltar atrás e parar no tempo. Bem no fundo de mim mesmo, no indevassável onde as imagens mais belas se ocultam.  A imagem ansiosa pela volta de meu pai que, montado do Corrupio, tinha ido ao Centro fazer compras. Tinha certeza de que ele traria um livro de histórias para mim. Meu coração batia descompassado quando o via abrir a porteira e se aproximar. Naquele tempo não existia tempo. Os dias, as horas, os minutos corriam sem avisar, sempre trazendo sob seu manto momentos de segurança e de paz. Tempos em que não havia televisão, em que não se lia jornal, não se sabia se alguém estava em guerra contra alguém. Nem se sabia mesmo o que era guerra. Ninguém ficava sabendo que matavam crianças. Se havia “mensalão”. Não se sabia que homem casava com homem e mulher com mulher. Ao lado do imenso ingazeiro, nadávamos no poção, todos nus, sem malícia, nem sabíamos o que era pecado. Víamos, com os olhos puros que Deus nos deu, bois e vacas se  cruzarem. Sabíamos que estavam fazendo bezerrinhos e era só. Olhava meu pai e o Antônio Eloi “desengastalhando” cria do ventre da vaca e chorava de alegria quando conseguiam tirar o animalzinho lá de dentro.

Naquele tempo, eu não sabia o que eram contas a pagar, o que eram bancos, juros, ágios, inflação, Fifa, Maracanã. Mas me encantava com aquelas moedinhas que os motoristas de caminhão me atiravam quando, correndo, eu lhes abria a porteira do pastinho de cima.

Não sabia o que era política. Não sabia que pais jogavam crianças pelas janelas. Não sabia o que eram drogas. Não sabia que os homens matavam uns aos outros para roubar.

Depois a gente vai ficando velho e vai descobrindo que o mundo é mau. Vai sentindo que os homens cada vez mais se afastam de Deus.    

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro thprata@terra.com.br

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Logotipo JM OnlineLogotipo JM Online

Nossos Apps

Redes Sociais

Razão Social

Rio Grande Artes Gráficas Ltda

CNPJ: 17.771.076/0001-83

Logotipo JM Magazine
Logotipo JM Online
Logotipo JM Online
Logotipo JM Rádio
Logotipo Editoria & Gráfica Vitória
JM Online© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por