ARTICULISTAS

Onde está Amarildo?

Amarildo de Souza, 47 anos, ajudante de pedreiro

Mário Salvador
mariosalvador@terra.com.br
Publicado em 06/08/2013 às 19:36Atualizado em 19/12/2022 às 11:42
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Amarildo de Souza, 47 anos, ajudante de pedreiro, pai de seis filhos. Mais um caso de pessoa desaparecida agita o país. Em 14 de julho, Amarildo foi levado por quatro recrutas até a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), na favela da Rocinha. Era muito conhecido por ser o único servente de pedreiro capaz de carregar nas costas, de uma vez, dois sacos de cimento. Por isso mesmo, era quem vencia a escadaria da favela carregando doentes nas costas. E sempre afirmava que pobre não pode levar tapa na cara sem reagir.

O comandante da UPP afirma que liberou Amarildo assim que constatou, comparando-o com uma foto, que não se tratava do traficante procurado pela polícia. Desde então está sem resposta a pergunta: Onde está Amarildo?

O governador Sérgio Cabral enfrentou protesto de rua específico, dentre outros, sobre esse fato. Se Amarildo houver sido morto pela polícia, esse será mais um problema para o governador enfrentar, já que as UPPs são uma criação de Cabral na tentativa de levar paz às conturbadas favelas cariocas.

Casos de desaparecimento, muitas vezes ligados a crimes insolúveis, atravessam o tempo. Enquanto estimativas oficiais calculam 40 mil desaparecimentos por ano no Brasil, um levantamento feito por empresa particular aponta 141 desaparecimentos por dia, sendo que alguns casos ganham maior repercussão. O menino Carlos Ramires da Costa - o Carlinhos - desapareceu em 1973, aos dez anos de idade, no Rio de Janeiro. O caso, abordado exaustivamente pela imprensa, permanece insolúvel.

Encontrava-me em Portugal, em 2007, quando a menina inglesa Madeleine Mc Cann, prestes a completar quatro anos, sumiu naquele país, enquanto os pais Kate e Gerry – que chegaram a ser acusados - jantavam no hotel onde a família se hospedava, em viagem de férias. Foi uma comoção nacional. Cartazes foram espalhados pelo país. Em um deles o apelo por notícias da menina era feito pelo ídolo português Cristiano Ronaldo. As polícias portuguesa e inglesa se debruçaram sobre o caso. Bem recentemente surgiu uma notícia de que a garota está viva, mas não houve comprovação.

Familiares e amigos de desaparecidos não superam o trauma provocado pela falta de informação do paradeiro de seus entes queridos e pela dor de não os encontrar ou não os sepultar. Dentre os que passam por esse drama, estão famílias de desaparecidos políticos no Brasil; Mães da Sé, que buscam notícias dos filhos e ocupam escadarias da Catedral da Sé, em São Paulo; Mães da Praça de Maio, que exigem do governo argentino notícias dos filhos desaparecidos durante a ditadura militar; e a família da paranaense Elisa Samúdio, mãe do filho do goleiro Bruno. A dor devastadora da perda e a esperança do reencontro levaram muitas dessas pessoas ao apoio às famílias que passam pela mesma dor, numa luta solidária que, lentamente, contabiliza conquistas.

Em dois casos emblemáticos recentes, mulheres mantidas em cárcere privado tiveram oportunidade de reconquistar a liberdade e recomeçar suas vidas: Elizabeth Fritzl, presa por 24 anos pelo pai Josef Fritzl, em Amstetten, Áustria; e Amanda Berry, Gina DeJesus e Michelle Knight, presas por cerca de 10 anos em Cleveland, estado de Ohio, Estados Unidos, por Ariel Castro.

Contas de Cemig, recibos de pagamento de pedágio, bilhetes de loteria, programas de televisão, sites diversos... publicam fotos e informações básicas para possível reencontro dos desaparecidos e suas famílias. Familiares apelam formas diversas solicitando ajuda nessa procura. Internautas solidários compartilham fotos de desaparecidos. É difícil acreditar que, em meio a tanta informação e a polícias capacitadas, as pessoas desapareçam e virem um nada.

Há ainda criminosos desaparecidos ou não encontrados, por terem engendrado crimes insolúveis, como o que aconteceu em São Paulo, envolvendo um corpo encontrado dentro de uma mala. E desaparecidos especiais, como aconteceu ao político José Dirceu, que, no exílio, sofreu cirurgia plástica para mudar sua fisionomia (e mais tarde a desfez), mudou de nome, constituiu família, teve filhos e só depois revelou sua história à esposa. Na verdade, ele mesmo se encontrou.

A família de Amarildo continua convivendo com a dor; o povo, com a indignação. A resposta à pergunta do momento ainda não veio. Todos estão fartos dos erros das autoridades, principalmente quando esse erro constitui uma injustiça a um homem de bem. Mais do que saber onde está Amarildo, todos querem um final feliz para essa história: todos querem que ele apareça. E que, mesmo pobre, tenha uma vida digna, como prega a Constituição.

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