Todos os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) têm se manifestado reiteradamente quanto à conduta a ser seguida por juízes,...
Todos os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) têm se manifestado reiteradamente quanto à conduta a ser seguida por juízes, como divulga a mídia: “Furtos de pequeno valor não devem ser considerados crimes.” (Folha de S. Paulo) Levantamentos internos apontam que esses magistrados consideraram insignificantes os delitos praticados em pelo menos 14 dos casos julgados em 2008.
Ao chegarem os recursos ao STF, os ministros decidiram pelo arquivamento das respectivas ações penais, que corriam em primeiro grau. Com isso, foi ordenada a soltura dos condenados, que ainda estavam presos por delitos como o furto de um violão e de um alicate industrial.
Conforme esclarecimento do ministro Carlos Ayres Brito, quando esse tipo de crime é analisado, ainda na primeira instância, deve ser aplicado o princípio da bagatela, também conhecido como princípio da insignificância. Por essa razão, os doutrinadores os denominam como crimes de bagatela. “Normalmente, as pessoas que os praticam são movidas por extrema carência material”, afirmou o ministro.
Não há a obrigatoriedade de todos os magistrados do país seguirem essa conduta, mas ela sinaliza que, nesses casos, não devem ser aplicadas penas privativas de liberdade, ou seja, detenções e reclusões.
Sem dúvida alguma, a importante decisão do STF pode evitar prisões que, em muitos casos, acabam punindo o criminoso de maneira exagerada. Chamou a atenção de todos o caso de Maria Aparecida de Matos, presa durante um ano e sete dias, por ter furtado um xampu e um condicionador.
Há um pensamento que traduz bem os efeitos de uma prisão injusta: “Mais vale um criminoso solto do que um inocente preso.” Isso remete a outro problema: E o criminoso, que já cumpriu a pena que lhe foi imposta e continua preso? Um levantamento do jornal Folha de S. Paulo, em dezembro de 2008, mostrou que pelo menos 9.000 pessoas continuavam na prisão, mesmo com suas penas já cumpridas.
Sem dúvida, a caracterização do crime de bagatela é uma verdadeira revolução no Direito ou, melhor dizendo, uma evolução do Direito. Afinal, nele, distingue-se um crime que está formalmente caracterizado (por corresponder à previsão do Código Penal), mas, materialmente, não é uma infração, dada a insignificância do dano ao patrimônio alheio.
Já existe a característica do furto famélico, que é aquele em que o indivíduo furta algo para matar a própria fome ou a de seus familiares, não pretendendo se enriquecer com o produto furtado. E agora surge a caracterização do furto bagatela, em que há inexpressividade da lesão ao patrimônio alheio.
Se todos os juízes, como exemplo, acatarem o princípio da bagatela, é certo que muito ladrão de galinha ficará fora da prisão. Há que se julgar, entretanto, caso a caso, “verificando-se a mínima ofensividade, nenhuma periculosidade social, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão”. Isso quer dizer, trocando em miúdos, que o autor do crime é um bom ladrão e merece perdão. Ou não merece prisão.
E na outra ponta temos os grandes roubos, os vultosos desvios de dinheiro, os infinitos crimes do colarinho branco, os golpes sem fim no erário e as mais diversas falcatruas, que sempre dão trabalho aos ótimos advogados conhecedores das leis e sabedores de como livrar seus ricos e endinheirados clientes das grades.
Fica a impressão de que o crime já está quase compensando, nos extremos: no muito e no pouco. Mas não há nada que pague uma consciência tranquila.
(*) membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro