Uma das boas coisas da vida é encontrar amigos. Alguns desses encontros são fortuitos. Acontecem assim por acaso. Damos com eles numa virada de esquina. Às vezes levamos até susto com tamanha coincidência. Quem comenta genialmente sobre isso é Milan Kundera em sua abra prima “A insustentável leveza do ser”
Algumas pessoas gostam de passar fins de semana em ranchos, comendo, bebendo e dormindo. Outros preferem o futebol. Outros se enfurnam nos bares. Alguns, cada vez mais numerosos, atropelam uns aos outros nos shoppings. Esses não me atraem. O apetite consumista é devorador e nos comem pelos bolsos.
Gosto de frequentar lugares onde encontro dezenas de amigos, alguns há séculos não vistos. Velhos amigos. Alguns há mais de quarenta anos. O nome muitas vezes já eliminado de meus neurônios cansados já queimando óleo trinta, mas a fisionomia não desaparece nunca. “Conheço esse cara, qual é mesmo seu nome?” Ele nos afoga com delicadezas e sorrisos, mas quem é ele? Conversamos, dizemos brincadeiras. Forçamos a memória e... nada.
Olhe, meu amigo, você pode até rir-se de mim. Passo meses sem ir a um shopping, mas ao Supermercado Guarato vou quase todos os dias. Parece que combinamos encontrar lá com amigos cuja existência nem mais era lembrada. Mas não é só por isso. São vários os motivos. Lá encontro quase tudo que exigem minhas minguadas necessidades diárias. A delicadeza, competência e educação dos servidores são dignas de louvor. Pedimos informações e elas nos são dadas com eficiência. Não apenas indicam, mas levam-nos ao local mostrando-nos com presteza. Há vários supermercados em Uberaba, todos muito bons, mas no Guarato há mais clima familiar. Há sempre um deles à disposição para levar nossas compras ao carro.
Passamos a conhecer quase todos pelos nomes. Virou casa de família. Não se fica um dia sem encontrar lá vários amigos. Não se pode ter pressa lá no Guarato. Parece que nossos amigos nós combinamos de encontrar lá. Não se anda depressa. Há sempre uma paradinha obrigatória para um papo. “Não se lembra mais de mim, Padre Prata? Quem celebrou meu casamento foi o senhor. Faz 39 anos. Tivemos três filhos, dois já estão formados. O último forma no próximo ano, em Medicina”. É um impressionante reflorescimento de amizades. Passo muita vergonha, alguns ficam sentidos se não me lembro mais do nome deles. Lembrar como? Estou com 90 anos, meu irmão Hugo diz que meu tempo de validade já acabou. Guardo fisionomias, mas nomes... é uma lástima. Mas eles me perdoam e fazem questão de demonstrar que ainda gostam de mim. Conversamos, conversamos e saio dali sem saber com quem conversei, mas com a alma leve e se arrebentando de gratidão. Como são bons meus amigos. Deus os abençoe. E abençoe também o pessoal do Guarato, pela oportunidade que me dá de viver com alegria meus últimos dias, sabendo que deixei para trás um montão de amigos.
(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro