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Queria

Abraçou-a como se houvesse intimidades a serem compartilhadas

Gilberto Caixeta
gilcaixeta@terra.com.br
Publicado em 19/11/2013 às 20:21Atualizado em 19/12/2022 às 10:10
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Abraçou-a como se houvesse intimidades a serem compartilhadas, embora fossem velhos conhecidos. Pensa que aqueles sussurros melancólicos e os sorrisos largos estivessem retidos em seu caule. Lembrou-se do churrasco e em suas raízes se assentaram para se falar de amor. Agora se encontram, ela sempre ali, e ele pra lá e pra cá ao longo desta distância. Ele, ao vê-la, abraçou a num demorado encosto de face em caule tatuado e liso. Ficaram ali, assim. Seu corpo era rente ao dela, e não teve pudores para se ajeitar melhor, de tal sorte que não houvesse espaço entre os seus corpos, e lembrou-se daquela que sempre amou. Abraçado, se energizou de lembranças, sem se condenar a valores que sejam. Lembrou-se do dia em que estavam sob o mesmo quiosque a comemorar um encontro de pares apartados, convergidos em equivocados. Ela e eles, ele e elas. Quando usava um biquíni singelo e pudico para um corpo que gritava escandalosamente prazer. Ele, sem vaidades, que não fossem ela. Olhavam-se. Depois de tantos anos ele retorna ao mesmo local e só encontra quem ele abraça silenciosamente. Ali se alimenta de um passado que não se efetiva no presente. Viver do passado é abrir uma cratera dentro de si, que a tudo suga e devolve o vivido. Esse é o grande perigo de quem vive e se alimenta de seus remorsos. O remorso é a possibilidade do ter tido, só não foi por causa de. É o de que mata o hóspede ao receber o hospedeiro. Deixou os braços caírem num escorregar acre e se virou de costas a continuar o movimento, até se sentar nas raízes, que antes eram finas e menores. Assim olhou o lago. Viu as paisagens ao redor tão bem cuidadas, como se fossem o jardim predileto da casa. Onde todos os dias são aguados, aparados, num cuidar sem fim. Mirou as árvores crescida e indiferente à história ali colocada. Agora, novamente a buscar na lembrança o amor impossível na presença. Ela com as suas filhas e ele com as dele, cada qual em seu rumo, que à época não era assim. O tempo foi junto com tudo querido, imaginava. Levantou-se e tomou o bulevar em direção seguinte. Caminhou e viu o tanto que o verde estava cuidado, num contraste com as construções rachadas em desmazelo de uso e de cuidados não ocupados. Olhou a piscina, as quadras, o restaurante e lembrou-se da boate e do salão de festa usados em carnavais e hoje abandonados e plantados sem uma destinação que não seja o olhar da reprovação, porque foi feito e do porque não cuidado. Igual aquele amor que poderia ter sido cuidado, melhor irrigado, assumido, que se houve erros foram cometidos como possibilidades do acerto e não do querer errar para não dar certo. A arquitetura, como o corpo sem cuidado, é corroída, como se não houvesse a quem receber, enquanto os jardins e quadras e campos recepcionam a alegria do encontro. 

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