Já escrevi sobre a dificuldade de nossa juventude em dois graves aspetos: ler e escrever. A internet é sua vida literária, e nada mais. Hoje, apresento-lhes penitência doméstica
Já escrevi sobre a dificuldade de nossa juventude em dois graves aspetos: ler e escrever. A internet é sua vida literária, e nada mais. Hoje, apresento-lhes penitência doméstica. Vejam a crônica da minha neta Fabiana. Deus existe!
“Então, de repente te colocam em um avião e falam que você está indo para o Canadá... Vai ficar na casa de desconhecidos, em um intercâmbio, durante o tão sonhado mês de julho, onde, em tese, não se teria aula, mas que em decorrência da viagem você vai ter que frequentar um curso de inglês todos os dias. Repit todos os dias.
Tem gente que viaja para comprar, outros para aprender outra língua, viver experiências novas, conhecer o lugar que sempre sonhou... Mas, no meu caso, eu fui sem pensar em coisa alguma, meramente porque deu na telha dos meus pais. Acabou que hoje vejo o tanto que a viagem mudou coisas em mim, foi realmente uma boa experiência.
Confesso que nada sai muito normal para mim, só de começo fiquei em uma casa de indianos junto de uma japonesa. Sendo eu brasileira e estando no Canadá – quanta diversidade cultural, não? Perguntaram-me se eles falavam ‘Hare baba’; eu mereço... Toda a família foi bem paciente comigo, mesmo eu falando rápido e tendo dificuldades até para usar o lava-louças (e nem falo sobre a máquina de lavar).
No primeiro dia em que eu fui para o centro da cidade fiquei perdida por cerca de duas horas. Meus ‘pais do Canadá’ tentaram impedir algo assim e até imprimiram mapa do Google Earth. Não adiantou nada – eu tinha que achar o ponto de ônibus até minha casa; é bem mais fácil do que parece e foi muito mais difícil do que realmente era, pelo menos para mim. Enfim, depois de pedir informações para vários desconhecidos (que rabiscaram muito meu mapa e me levaram para lugares muito mais confusos), eu achei o ônibus, mas ainda me perdi no bairro da minha casa, apenas porque não cheguei à conclusão que tinha que atravessar a rua para ir até lá. Como sobrevivi até aquele dia? Só Deus sabe!!!
Minha grande amiga nessa viagem foi justamente a japonesa. No alto dos seus vinte e dois anos desfrutava de suas últimas férias longas. Acabei me apegando muito a ela, e conversamos muito sobre a cultura de nossos países. Ela diz que pretende trabalhar criando livros didáticos, comentei ao acaso, que brasileiros pensam em várias outras coisas além do trabalho (futebol, games, novela, falar mal dos políticos...), e ela disse: ‘Mas trabalho é vida!’ Tá bom, Mayumi, prometo que vou me esforçar!
Passei por várias outras experiências que me ensinaram como me virar sozinha, mas me surpreendi comigo mesma também! Embora tenha descoberto que não sei ler mapas, falar inglês se mostrou uma tarefa muito mais fácil do que parecia. Algumas dificuldades continuam, ainda assim estou muito melhor do que quando cheguei lá.
Tudo no Canadá é ótimo, mas, lamentavelmente, a comida não – ainda mais em uma casa de indiano onde tudo tem pimenta, até quando eles pediam pizza – eu praticamente não conseguia jantar! Bom, eles até “tentavam” diminuir a pimenta para mim. Acabei ficando apenas três semanas com eles, pois infelizmente eles estavam se mudando de casa e eu tive que trocá-los na última semana por legítimos canadenses. Saí levando na mala algumas roupas indianas e com elas bastante saudade.
Em meio aos meus muitos tropeços e mancadas acabei levando minha viagem muito mais a sério que pensava, e deixei todas aquelas experiências me ensinarem. Estou meio triste por chegar, uma parte queria continuar lá, a outra esta até feliz por voltar para debaixo das asas da minha mãe! Acredito que o tempo tenha sido o bastante, e que vivi tudo o que era possível viver lá neste tempo. Espero mais viagens como essa! Leu isso, pai? Dá próxima vez espero ajuda, viu, vô?”
(*) médico e pecuarista