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Sem pressa de morrer

Em encontro para discutir reformas na seguridade social, num contexto de crise econômica...

Mário Salvador
mariosalvador@terra.com.br
Publicado em 29/01/2013 às 08:48Atualizado em 19/12/2022 às 15:02
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Em encontro para discutir reformas na seguridade social, num contexto de crise econômica, Taro Aso, 72 anos, ministro das Finanças do Japão, disse que idosos doentes devem ser autorizados a “se apressar e morrer”, para aliviar a pressão sobre o Estado, responsável por pagar as despesas médicas.

Com a maior expectativa de vida do mundo, o Japão, país de ricas tradições, carrega o pensamento milenar de que idoso é ídolo. Um quarto de seus 124 milhões de habitantes tem mais de 60 anos e, nos próximos 50 anos, 40% da população estará nessa faixa etária.

O indigesto falatório, destaque na mídia mundial, levou Aso (que já assinou documento recomendando a familiares não prolongarem sua vida por meio de tratamento médico) a reconhecer que sua fala foi inapropriada para um evento público e admitiu ter expressado apenas uma preferência pessoal.

É massacrante lidar com doente em fase terminal, mantido vivo graças a recursos da medicina e cuidados de abnegados médicos e familiares, sabe-se lá por quanto tempo, sem que haja esperança. E cada caso balança a estrutura familiar, com sua carga enorme de emoção, porém é certo que ninguém quer adoecer e dar trabalho a terceiros.

Barbara Gancia, da Folha de S. Paulo, passou por perda recente e diz concordar com Aso. Ela explica que, mesmo com o parente pedindo, não é fácil apagar-lhe o último sopro de vida. É pensando nessa dificuldade que muitos pacientes o fazem por suas próprias mãos, como aconteceu com o ator Walmor Chagas. Gancia aborda o assunto do ponto de vista do cuidador. Mas o ponto de vista do idoso parece ser outro.

Talvez só tenham direito de reclamar de cuidar de um idoso doente aqueles que, quando bebês, trocaram as próprias fraldas, prepararam mamadeira e banho para si e nunca choraram de madrugada.

Não temos o conhecimento dos psicólogos, que sabem tratar com propriedade acerca deste assunto; ousamos falar fundamentados na experiência de vida: é infantil a ideia de querer resolver problemas desejando simplesmente que eles sumam, quando não os sabemos enfrentar. É possível encontrar soluções mais viáveis. E aqueles que têm competência para encontrar essas soluções é que devem assumir cargos públicos. Não é preciso ser covarde desejando a morte dos idosos, que não conseguem se defender.

Pessoa pública não é diretor de Big Brother, que faz o que bem entende com suas marionetes. Entre poder ouvir ministro que fala bobagens e idoso com experiência de vida, os japoneses fazem opção pelo segundo. Idosos podem oferecer, a quem precisa, lições de sabedoria e de respeito ao próximo, ensinamentos e exemplo de vida...

Eclesiástico 3,12-14 consola os que se dedicam ao idoso e adverte os que o desprezam: “Filho, cuida de teu pai na velhice, não o desgostes em vida. Mesmo se a sua [a do pai] inteligência faltar, sê indulgente com ele, não o menosprezes, tu que estás em pleno vigor. Pois uma caridade feita a um pai não será esquecida, e no lugar dos teus pecados ela valerá como reparação.” 

Não merecem relevância as palavras de Aso, pois só merece consideração aquele que tem consideração pelo homem. Acreditamos que ele julgou a importância do idoso pela importância que atribui a si mesmo. A falta de bom senso pode fazer brilhar a ignorância. Quem opta por ser homem público precisa, no mínimo, saber se comportar como tal. Talvez os idosos possam ensinar isso a ele.

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