Tenho repetido que cronistas hebdomadários (esta te pegou, Dino! Vai pro dicionário...) devem ligar seu escrito aos acontecimentos recentes
Tenho repetido que cronistas hebdomadários (esta te pegou, Dino! Vai pro dicionário...) devem ligar seu escrito aos acontecimentos recentes e chamativos. Isto estabelece um entendimento com seus leitores, que podem gostar ou desgostar do que está escrito – mas de qualquer maneira irão até o final da crônica, o que já é uma vitória. Pois bem, meus caros leitores, vocês devem estar pensand agora é Semana Santa, desta vez ele (no caso eu...) atolou o carro.
Existe uma histórica convicção, herdada dos velhos tempos, de que Semana Santa é de recolhimento espiritual, do sofrimento da paixão de Cristo, da penitência, abstinência de carne e suas paixões, a confissão, a expectativa do perdão e da glória da ressurreição – que só acontece no domingo final. Passo e assisto à Semana Santa dos Novos Tempos. No Antigo, nem música ou barulhada forte cabiam nestes dias. Era esquisito, eu me lembro, a gente falava baixinho, estava no Evangelho da missa a Paixão segundo São Mateus, o mais extenso e perfeito relatório do final de Jesus Cristo e dos tribunais da terra. Era triste, eu era garoto, imaginem, participando e assistindo da procissão dos encontros, emocionante, as ruas repletas, um bater no peito triste, sofredor, contagiante. Vi gente chorar, meus amigos. Gente grande e vivida, bater no peito, o pedido de perdão escondido valendo pelos pecados escondidos e desconhecidos.
Eu me lembro, amigos, há coisas que a infância guarda pela vida afora. Aquela Semana era triste, pesada, difícil de passar e terminar. Vinha afinal a Páscoa, a Ressurreição, a grande Festa. Acontece, devo confessar, que me impressionava mesmo era a Semana, seu silêncio pesado e triste, que nem a pregação vitoriosa dos nossos sacerdotes conseguia apagar. Aí eu, moleque, pensava aqui comig por que não fazer um dia o sofrimento total, e depois na semana inteira a alegria da Ressurreição? Agora, visto e passado o quase tudo da vida, acho que Mateus tinha razão. Era preciso contar tudo, porque o tudo é como é a nossa vida, uma passagem, apenas, de onde nos lembramos com facilidade dos sofrimentos, das injustiças, da morte de ideais e sonhos.
Em nossa visão curta e interesseira, não pensamos na Páscoa da alegria de viver, dos filhos, dos amigos, das tantas alegrias e felicidades que Ele nos deu, discretamente, sem pedir troca ou reconhecimento. Eu vi, nós todos vimos, o julgamento da menininha assassinada pelos pais. De triste, achei ver tanta gente feliz com a condenação dos réus, que só Deus poderá julgar. Eu mesmo, de certa forma, participei: a crueldade é sempre repugnante. Mas, e aquela história do Cristo vivo junto à pecadora que devia ser apedrejada para morrer? E Ele calmo... quem não tiver erro, atire a primeira pedra... Nós não matamos Natalias, mas será que não matamos sonhos, alegrias, felicidades que valem tanto quanto uma vida? É aquela história final: a Ressurreição é que vale, mesmo passando pela morte. A todos que me assistem e toleram: uma Feliz Páscoa!
(*) médico e pecuarista