ARTICULISTAS

Sentido da cumplicidade

Dom Paulo Mendes Peixoto
Publicado em 09/04/2021 às 20:03Atualizado em 19/12/2022 às 03:57
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Na Encíclica Fratelli Tutti, o Papa Francisco alude a certos casos de fechamento e de silêncios coniventes com o mal. São atitudes que não se primam pela transparência e honestidade e impedem que seja construída a verdadeira amizade social. O que está subentendido aí é a injustiça, que ocasiona descontentamento na comunidade, conflitos e incapacidade para gerar convivência feliz.

A cumplicidade com propósitos escusos deixa como legado para o povo grandes feridas recalcadas de injustiça. São realidades que nunca podem ser abandonadas e esquecidas, porque ficam rastros de sofrimento. No mínimo, por causa de malvadez nas atitudes, alguém acaba sofrendo por ser ferido em sua dignidade. O Papa cita o que fizeram bombardeando Hiroxima e Nagasaki.

Na história dos povos, muitas atitudes causam vergonha para a humanidade, que não podem ser esquecidas e nem anestesiar as novas culturas. Além da tragédia de Hiroxima e Nagasaki, tivemos grandes perseguições, comércio de escravos, massacres étnicos, que não podem desaparecer da mente humana. Sem mente histórica não se consegue avançar e revela conivência com um passado injusto.

O horror às violações aos direitos humanos do passado deve aguçar a memória das sucessivas gerações do futuro para ser contra toda vontade de domínio e destruição. É muita insensibilidade querer justificar erros de hoje a partir dos erros do passado, porque o mal não pode ser justificado com outro mal. Procedendo assim, a história cultural das gerações estará sendo sempre conivente com o erro.

O caminho mais eficaz, acima de qualquer ato de vingança em relação às violências do passado, é a via do reconhecimento, do perdão e da mudança de rumo na conduta de vida. Isso não significa conivência e nem esquecimento do fato sombrio de outros tempos, mas consciência de responsabilidade maior em relação ao respeito que devemos ter aos valores da vida humana nos novos tempos.

O Papa Francisco diz que não se trata de impunidade. Ele fala de perdão, e não descarga de rancor, de vingança, porque esse formato não ajuda a sociedade a construir a paz, mas alerta para a prática da justiça, essencial para que exista o verdadeiro perdão. Os órgãos de Estado têm o compromisso premente de arbitrar em relação às questões que afetam a harmonia no meio de seu povo.

Dom Paulo Mendes Peixoto - Arcebispo de Uberaba

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