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Sequer me reconheço

Nasci em uma rica fazenda de meu avô

Manoel Therezo
Publicado em 05/01/2013 às 19:23Atualizado em 19/12/2022 às 15:29
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Nasci em uma rica fazenda de meu avô, pai de minha mãe. A história é longa—mas, roubaram de minha mãe, os direitos, mesmo sendo a única herdeira de seu pai, (meu avô). Mudamos para Jardinópolis (SP). Nesse vilarejo fui um menino pobre. Com certeza, o mais entre os meus amigos. Todos tem o direito de falar de sua mãe. A minha, foi um COLOSSO. Mesmo sem recursos, fazia tudo para que eu me sentisse igual aos meus amigos. Lembrando-me hoje das coisas que fazia para que eu não me sentisse diferente, choro escondido para ninguém me ver chorar. Para garantir a entrada no cinema, eu distribuía os folhetos que anunciavam os seus filmes. Qual menino daquela época, não esperava sentado nos calcanhares, à porta do cinema se abrir? Grandes filmes ficaram na minha saudade. Qual menino do meu tempo, não assistiu O Retrato de Dorian Gray? Segundo se lê, no século 16, era um tanto comum, fazer retratos mágicos de grandes personalidades. Eram feito misturando-se sangue, fragmentos de unhas, cabelos e pele do seu proprietário—exatamente como na bruxaria. O retrato era o duplo vivo de seu proprietário. Tudo que acontecesse, haveria de ocorrer naquele retrato. Nada acontecia ao seu dono. De quando em vez no filme, focavam o retrato para que fossem vistas as coisas que deveriam estar no rosto de seu proprietário. O retrato estava cheio de rugas, manchas melânínicas, pele envelhecida, cabelos grisalhos, enquanto no proprietário, via-se um rosto jovial, bonito, sem aqueles acidentes. O retrato envelhecia. O seu dono não. Aquela fantasia ficava em nós que, embevecidos pela beleza das cenas, voltávamos assistir o filme várias vezes. Até hoje não me esqueço do Retrato de Dorian Gray. Nunca mais ouvi nada a seu respeito. Ocasionalmente, leio uma estranha nota como sendo acontecimento verdadeiro no livro “Historia desconhecida dos Homens” de Robert Charroux, que entre linhas, parece referir a historia de Dorian Gray. Conta que em Paris, um senhor jogou-se no rio Sena, sentindo o corpo se queimando. As pessoas que o assistiam aos gritos, de fogo! Fogo! não viam chama alguma naquele senhor em desespero. Todos entenderam que ele havia se enlouquecido. Pouco depois, era retirado morto. Mais tarde, foi verificado que naquele exato momento, mesmo por coincidência, sua casa havia se incendiado e, que de um retrato seu que mantinha dependurado, apenas restavam às molduras metálicas. No filme, o proprietário veio a falecer. Em belíssima cena, a pele envelhecida, as rugas, as manchas de melaninas, os cabelos grisalhos que estavam no retrato, vagarosamente se transportavam para o proprietário falecido. A velhice trocava de lugar. O retrato ficava jovem e o proprietário se envelhecia. Aquela passagem vista vagarosamente, marcava um espetáculo bonito no cinema daqueles tempos. Se, na vida assim pudesse acontecer, todos teriam um retrato para não envelhecer. Eu mesmo teria um. Embora sem compromisso com retrato algum e ainda estando vivo, quando me vejo no espelho e olho o meu retrato de passados tempos, me vem à mente, o Retrato de Dorian Gray e, SEQUER ME RECONHEÇO.

(*) Odontólogo; ex-professor universitário

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