Poderia existir um sentido na dor. Havendo, Deus poderia nos falar de forma diferente, se Ele voltasse a acreditar em nós e quisesse nos falar mansamente.
Sofro, profundamente, com as tragédias das três meninas como se elas existissem dentro de mim. Elas são jovens, eu nem tanto. Não as conheço nem elas a mim e me liguei a elas pela dor, que não sabia que pertencia a mim. Não sabia que existiam outras pessoas dentro de mim, além das que eu conheço e prezo.
Penso e sofro, com as dores dos familiares dos algozes e de suas vítimas. Se talvez fôssemos cultivadores de felicidade, o desamor não seria colhido pelas mãos.
O assassinato da universitária de medicina, a execução da estudante refém e o retorno da adolescente ao cativeiro, após ter saído do local, deixam-me nu perante Deus e a mim mesmo.
Pouco ou de nada valem as nossas orações, os nossos templos, as nossas oferendas, porque são feitos por nós, homens fracos; Deus só atende aqueles que não O temem, que em nada crêem, e para quem de nada vale a vida alheia, exceto tirá-la, mesmo que, um dia, tenham se valido do afeto e do carinho para seduzi-las.
Onde estavam as falanges espirituais do amor, os cânticos de fé, que não interferiram quando o mal arregimentou os seus. Quando Deus silenciou em Sua desilusão com os homens por tê-los feito à Sua imagem e semelhança.
Quando Jesus submeteu Jó à prova, não era mais um moço, e sim um homem poderoso, e o fez rolar no chão de tanta dor. Mas elas são jovens demais. Não O entendo. Se não queres fazer os milagres de antes, o mundo deixou de ser digno de Tu e, mesmo que quiseste, os pecados se oporiam a essa vontade. Não fazes isso com os jovens.
Por que nos fazes de Jó? Quando foste visitado pelo Demônio, acreditaste no homem. O Demônio, então, Te falou outrora: "É preciso seduzir o justo com tentações". E Tu, Senhor, o respondeste: "Pois tente fazê-lo com Jó, meu servo". Mas, talvez, tenha dit "tente fazer com os homens que criei à minha imagem e semelhança".
Deus creu em nós e nós, descremos. Quando sofremos, O procuramos; no abandono, rogamos; na felicidade avizinhada, escondemos; na morte, se resigna quando se está velho e doente.
Volte a acreditar em sua criação e permita-nos "que, na dor, sejamos sábios; na fealdade, benevolentes; na amargura, meigos; na doença, fortes". Ressuscita-nos matando o velho homem preso aos conflitos, adoecido pelos transtornos, imediatistas da fé.
Ressuscita-nos para a evolução, para a compreensão de que há corações vazios, dores desnecessárias. Esvazie as nossas mentes viciadas na paixão e na razão, que nos afogam e, ainda, O culpamos pelos nossos reveses.
Há um Jó dentro de mim, posto pelo mundo.
