No salão de café de uma panificadora estávamos todos descontraídos quando de repente: Bum! Algo bateu na janela de vidros temperados e caiu do lado de dentro. Todos ouviram o estrondo, inclusive eu, mas ninguém inicialmente se mexeu para ver o que havia caído naquele piso de porcelanato. De longe me retorci na cadeira e vi que algo mexia próximo aos pés de um freguês, que apenas olhava.
De uma mesa atrás da minha e de costas para mim levantou-se um jovem, que constatei, depois, estar com a esposa e duas filhas adolescentes. Ele foi em direção ao corpo estranho, imóvel no chão. Era uma pomba-de-bando (Zenaida auriculata) que tentou entrar naquele salão pela janela, errou o rumo e bateu no vidro, que estava entreaberto. O jovem socorrista se abaixou, tomou a ave com as duas mãos, olhou-a carinhosamente, afagou suas costas e a colocou no parapeito da janela. Dali para o mundo, depois de recobrar os sentidos, ela voou para o seu impróprio habitat urbano; um poste da rede elétrica.
Não me contive e abordei aquele pai de família, na volta. Enalteci o seu gesto, quando muitos no mesmo instante poderiam estar matando animais da mesma ou de outras espécies, extinguindo com os seus lugares onde vivem.
Vi o lado sensível aflorar naquele pai quando me expressou o seguinte: - “Tudo faço para proteger o meio ambiente, porque todos nós fazemos parte e dependemos dele para viver. O dia que a humanidade entender profundamente que o ar respirado por um é o que o outro respirou ou vai respirar, aí sim, a vida tomará outro rumo”.
Completei o raciocínio fazendo-lhe uma pergunta dramática: Você já imaginou se cada um de nós pudesse escolher o tipo de ar para respirar? A resposta dele foi imediata: - “Nunca imaginei, mas seria o caos ver todo mundo intubado. Sem poder fazer isso, o homem já destrói a si mesmo. Imagine se ele pudesse comprar o ar que respira?”.
Sem tomarmos muito do nosso tempo mútuo, encerramos o diálogo. Encaminhei-me para a saída e o jovem ficou com sua família, decerto reportando-lhe sobre a conversa que tivemos. Observei que a atenção dos clientes voltou para aquela mesa. Vejam só; o simples socorro a uma ave foi capaz de polarizar as atenções até então dispersas.
É o caso. Quanto prazer sente os que salvam vidas e quanta angústia existe dentro daqueles que matam... Vale a pena socorrer, não importa a quem.
(*) Presidente do Fórum Permanente dos Articulistas de Uberaba e Região; membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro