VÔLEI

Mineiros no exterior exploram mercados 'não tradicionais' no voleibol

Issanayê Ramires e Rafael de Paula atuam em comissões técnicas na Ásia, longe de países 'badalados' no vôlei mundial

O Tempo/Débora Elisa
Publicado em 23/05/2024 às 22:00Atualizado em 24/05/2024 às 07:59
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Rafael de Paula no Darkulaib, no Bahrein (Foto/Arquivo pessoal)

Rafael de Paula no Darkulaib, no Bahrein (Foto/Arquivo pessoal)

Em inúmeras histórias, a oportunidade de jogar no exterior é um dos maiores objetivos na carreira de um atleta. No voleibol, mercados aquecidos na Europa e países asiáticos como Turquia e Japão abrigam sonhos de brasileiros que dão show nas quadras, mas, espalhados pelo mundo, existem outros profissionais que enxergam os países estrangeiros como uma possibilidade de atuar no vôlei, na beirada das quatro linhas.

Issanayê Ramires e Rafael de Paula são dois belo-horizontinos que vivem a realidade do vôlei na Ásia, mas longe dos mercados tradicionais. O primeiro é o atual treinador da seleção da Coreia, com passagens por Bahrein e Paquistão, enquanto De Paula atuou como preparador físico do Darkulaib, também do Bahrein, no ano passado, e está fechado para integrar a comissão técnica do Kazma, do Kuwait, na próxima temporada. Os dois compartilharam um pouco de suas histórias com a reportagem de O TEMPO Sports.

Início no interior de Minas abre portas para seleções

Issanayê começou a carreira no interior de Minas Gerais, em Caratinga, em uma escolinha de vôlei modesta. Depois de um tempo, chegou até a CT do Minas Tênis Clube, na capital mineira. No currículo tem experiências nas seleções mineiras e em seleções brasileiras de base. Com objetivo de comandar equipes profissionais, trabalhar no exterior seria uma possibilidade de se preparar profissionalmente para tentar achar espaço no mercado brasileiro.

“Sempre tive na minha cabeça que trabalhar no exterior poderia ser uma possibilidade. O meu objetivo de ser treinador do adulto do Minas era ousado, e para tal, eu necessitaria de ganhar experiência. Como o mercado brasileiro é muito disputado, com poucas equipes para muitos treinadores, sempre considerei essa hipótese, mas nunca foi uma prioridade para mim”, comentou Nayê.

Foi após bom trabalho em clubes nos Emirados Árabes e no Bahrein que as oportunidades de assumir seleções nacionais surgiram. Primeiro, trabalhou no próprio Bahrein, passou pela seleção do Paquistão e, no mês passado, assumiu como técnico da Coreia, no vôlei masculino. “É um mercado vasto de oportunidades de diversos níveis técnicos e financeiros. O treinador brasileiro é bem valorizado no mercado internacional, porém, poucos treinadores dominam o inglês ou estão dispostos a saírem do país”, comentou.
 

Preparação física com identidade brasileira

A trajetória de Rafael de Paula também começou na capital mineira, a poucos quarteirões do Minas: no Mackenzie. Como estagiário de preparação física de várias categorias e modalidades, o profissional acredita, hoje, que o início de carreira foi essencial para as portas que se abriram posteriormente. De Paula também passou pelo Minas, na academia dos atletas, e foi lá que conheceu outros profissionais que tiveram passagens pelo exterior e o ajudaram a abrir portas para experiências em outros países.

“Não pensei duas vezes porque esse meio de preparação física é muito difícil de entrar. São poucos os cargos. Em BH, podemos pensar que existem milhares de personal trainers, mas preparadores físicos são só dezenas. Posso contar nos dedos de uma mão os que têm oportunidade de ir para o exterior, então eu sabia que era uma que não passaria duas vezes”, contou De Paula sobre a primeira chance de atuar em um clube no Bahrein. “Mesmo se desse errado profissionalmente, eu sabia que era uma experiência de vida que eu não teria igual. É algo que vou contar para os meus filhos um dia”, continuou. 

E o trabalho foi bem feito. No ano em que atuou na preparação física do clube, foram campeões de cinco torneios em sete participações. Depois da campanha de sucesso, ele recebeu proposta de renovação no Darkulaib e também de outros clubes. Na próxima temporada, vai assumir como preparador físico do elenco adulto do Kazma, no Kuwait, um campeonato de nível um pouco maior do que o anterior.

Recepção de braços abertos

Para além da experiência profissional, viver uma temporada no exterior também acrescenta em bagagem e vivência. No Bahrein, De Paula afirmou que se surpreendeu com a receptividade do povo local, que tem um carinho especial pelo Brasil.

“Eles amam os brasileiros e têm muita referência do vôlei por lá. A gente colhe muitos frutos da geração do Giba, do Nalbert, do Anderson, etc. Também, eles têm muitos ídolos brasileiros em outros esportes. Por exemplo, lá no Bahrein idolatram o Vinicius Jr., então ‘chove neles e pinga na gente’ (risos). Eles me trataram como se eu fosse da família. Mesmo estando a 12 mil quilômetros de casa, nunca me senti sozinho”, contou.

Mudanças de hábitos são desafio

Mas, a grande diferença cultural também marca desafios profissionais, principalmente na área da preparação física de um esporte de alto rendimento. Na cultura muçulmana, por exemplo, o período do Ramadã significa uma mudança grande nos hábitos alimentares dos atletas, que passam a fazer jejum em períodos extensos do dia.

“Eles fazem um jejum desde quando o Sol nasce até quando ele se põe, então, se antes a gente treinava às 18h, tínhamos que passar os treinos para às 21h, por exemplo. Eu nunca pensei que teria que me preocupar com isso profissionalmente, mas tive que me adaptar. São coisas que temos que pensar e nos preparar para atuar em mercados como esse”, contou Rafael.

E como a cultura religiosa é muito forte, também é preciso respeitar os períodos de oração, que podem, inclusive, coincidir com os jogos. “Às vezes eles têm que orar bem próximo do jogo e isso afeta o aquecimento”, comentou De Paula, que também destacou uma temperatura habitual de cerca de 43ºC, um calor nunca experienciado na capital mineira.

Sem planos de retornar para o Brasil, o profissional não deixa de sonhar com, um dia, vestir uma camisa verde e amarela. Mas, existem, também, muitos outros sonhos.

“Tenho um sonho de disputar uma Olimpíada. A seleção brasileira é um desses sonhos, claro, mas também sei que há um mercado em outros países, como o próprio Nayê está na Coreia e o Lucas (Rodrigues) no Paquistão. Eu pretendo continuar trabalhando fora porque compensa financeiramente, e a tendência é que mais mercados se abram para mim. Enquanto houver interesse, vou seguir correndo atrás e sonhando”, concluiu.

Fonte: O Tempo

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