EM MINAS GERAIS

Assédio na PRF: por 'dano ao casamento', policial pede até R$ 500 mil em ação contra vítimas

Após O TEMPO dar detalhes da investigação da corregedoria que inocentou o acusado, Carta Aberta de mulheres quase dobrou o número de assinaturas

O Tempo/José Vítor Camilo
Publicado em 11/06/2024 às 09:55
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Foto mostra a sede da PRF em Minas, localizada em Contagem, onde os assédios teriam ocorrido (Foto/FLÁVIO TAVARES/O TEMPO)

O inspetor da Policial Rodoviária Federal (PRF), lotado em Minas Gerais, que foi alvo de denúncias de assédio sexual e moral por pelo menos seis mulheres - entre elas uma adolescente de 16 anos —, está pedindo indenizações por danos morais contra parte das denunciantes. Os valores cobrados por ele vão de R$ 56 mil a até meio-milhão de reais. Para justificar os valores pedidos, o policial alega que teve o casamento prejudicado devido às denúncias, das quais acabou inocentado pela Corregedoria-Geral em um processo administrativo que é questionado em uma Carta Aberta de mulheres da corporação. 

O processo interno da corregedoria da PRF, que correu sob sigilo e não acatou nenhuma das seis denúncias das mulheres, só se tornou público após as vítimas serem processadas na Justiça comum pelo homem denunciado pelos assédios, uma vez que as suas mil páginas foram arroladas como prova de sua inocência.

A reportagem de O TEMPO teve acesso a pelo menos dois dos processos movidos pelo inspetor, sendo que a argumentação usada por seus advogados foi a mesma. Para solicitar a indenização das mulheres que o denunciaram, o policial alega que, se fosse exonerado, perderia sua única fonte de renda e não teria condições de sustentar seus dois filhos e esposa. 

"O que, para um homem de conduta ilibada, facilmente resultaria em suicídio, pois sem condições de prover sua família e completamente arruinada perderia a razão de viver", argumentam os advogados do policial na ação.

Em seguida, eles afirmam que as denúncias feitas pelas mulheres foram "amplamente difundidas" na sede da PRF-MG, chegando ao conhecimento de diversos policiais e de suas esposas. "Os fatos aqui narrados abalaram severamente sua estrutura familiar, vindo a ser minimamente restabelecidos os laços após o julgamento do processo disciplinar onde restou comprovada a inocência do autor, mas, em verdade, é sabido que uma vez ameaçados laços de confiança, as dúvidas, questionamentos e inseguranças sempre vão pairar sobre a relação conjugal", continuam os advogados.

Procurada pela reportagem, a advogada Izabella Rocha Rinco, que representa o policial denunciado, informou que o valor pedido às mulheres teve como base "um cálculo realizado sobre qual seria o prejuízo enfrentado pelo PRF caso fosse demitido e perdesse sua única fonte de renda". 

Por nota, ela também argumentou que o processo foi “completamente pautado no devido processo legal e na legalidade”, completando que foram “acatadas todas e quaisquer sugestões da comissão de investigação preliminar”. 

“O PRF não acompanhou o testemunho das supostas vítimas que manifestaram interesse em sua ausência, a investigação preliminar e a maior parte do processo administrativo foram conduzidas com a presença de um membro feminino na comissão processante e as vítimas foram ouvidas em ambos os procedimentos, lhes sendo dadas a palavra, livremente, para expressar e relatar tudo que achassem adequado, podendo, inclusive, serem acompanhadas de advogado, caso assim desejassem. O PRF não recorreu ao sindicato, contratando advogada particular para acompanhar o caso”, escreveu.

Em seguida, a defesa do policial diz que o processo contou com realização de perícia no local do suposto fato, e oitiva daqueles que, segundo a advogada, “poderiam trazer informações pertinentes ao caso”. “Foi um processo longo e complexo, onde houve, inclusive, a ocorrência de falso testemunho, tendo a comissão autorizado prontamente que a suposta vítima se retratasse e não incorresse na prática de crime. O feito transitou em julgado com seu devido arquivamento, tudo com o pleno respeito ao devido processo legal e à lei. A inocência do PRF foi inquestionavelmente comprovada, e, finalmente, este pode tentar seguir sua vida, com sua esposa e filhos”, finaliza a nota.

Carta Aberta já tem mais de 600 assinaturas

Desde a última sexta-feira (7 de junho), quando O TEMPO divulgou detalhes da investigação arquivada contra o inspetor da PRF, o número de servidores da corporação que assinaram a Carta Aberta produzida por mulheres que atuam na polícia quase dobrou. Até então, após uma semana de divulgação nas 27 Superintendências do país, o documento tinha cerca de 350 assinaturas e, nesta segunda-feira (10), já passava de 600. 

Na carta aberta, o grupo expressa o que chamam de “profunda indignação” com a situação de possível “insegurança jurídica” que elas estariam sofrendo “especialmente no que diz respeito aos casos de assédio, mais especificamente quanto ao resultado de um processo correcional ao qual figurava como autor um PRF com lotação no Gabinete do Superintendente de Minas Gerais”, dizem no documento.

“É com grande consternação que observamos um cenário onde as vítimas de assédio, ao buscarem justiça, frequentemente se veem em uma posição de vulnerabilidade ainda maior. Ao invés de encontrar apoio e proteção, muitas de nós enfrentam processos jurídicos que se voltam contra as próprias vítimas, gerando um ambiente de medo e desamparo”, diz o documento que circula por meio do Sistema Eletrônico de Informação (SEI).

Entre as reivindicações da Carta Aberta estão a ampliação das campanhas de prevenção ao assédio; maior divulgação dos canais de denúncia; a implantação de uma Comissão Permanente sobre o tema; e, entre uma série de outras medidas, a obrigatoriedade de pelo menos uma mulher integrando as comissões que avaliam os processos administrativos de assédios. Leia a carta completa no fim da reportagem.

Relembre as denúncias

Primeiro, a Corregedoria-Geral da PRF recebeu a denúncia de uma policial alegando que o inspetor teria tentado beijá-la à força. Depois de 5 anos de apuração, a corporação entendeu que faltavam provas e que, por isso, o policial deveria ser inocentado e o processo arquivado, mantendo o suspeito em um cargo na Superintendência Executiva da PRF de Minas Gerais, um dos setores no topo da hierarquia da corporação.

No relato que originou a apuração, a primeira policial que comunicou oficialmente o assédio contou que estava em transferência de Brasília para a unidade mineira da PRF e, após pouco tempo atuando na Superintendência, já teria notado que o inspetor se portaria “de maneira muito próxima” e com “olhares indiscretos”. Ela, no entanto, destaca que se esquivava e mantinha uma postura mais fechada. Depois disso, os “toques” teriam se intensificado, com o suspeito a constrangendo em algumas situações, como ao segurar sua mão para olhar seu esmalte e, até mesmo, se “ajoelhar no chão” e segurar sua mão, como em um pedido de casamento, para pedir que ela fosse trabalhar em seu setor.

No Dia dos Namorados de 2018, o Chefe de Gabinete teria chegado a mandar uma mensagem tarde da noite para a colega. Nos textos, ele falava que, por conta da data, ele pensou que ela poderia “estar namorando”, dando a entender que ela poderia estar fazendo sexo naquele momento. Três dias depois das mensagens, o agente então teria formalizado o interesse de que a policial fosse trabalhar com ele, porém, isso só poderia ocorrer após o retorno do superior direto da mulher, no dia 25 de junho.

E foi exatamente nesta data que o assédio sexual denunciado teria ocorrido, segundo o relato da vítima. Logo cedo, o policial mandou uma mensagem para a mulher pedindo que ela fosse “tomar um café” com ele em sua sala assim que chegasse à Superintendência, reforçando para ela fazê-lo antes de conversar com o seu superior, que voltaria ao trabalho por volta das 10h. A policial foi até o gabinete acreditando que iria conversar sobre sua ida para o setor, mas, ao entrar na sala, o inspetor a teria segurado pela cintura e tentado beijá-la na boca.

Depois dela empurrá-lo e sair da sala, a mulher teria informado ao seu superior direto que não iria mais trabalhar para a Chefia de Gabinete, porém, não relatou o ocorrido imediatamente. Apenas mais tarde, após o então superintendente ligar indagando o porquê dela ter desistido da mudança de setor, é que a vítima resolveu confessar ter sofrido o assédio.

Adolescente de 16 anos está entre as vítimas

Foi a partir da primeira denúncia, e dos relatos de outros servidores da PRF - incluindo o próprio superintendente à época - acerca do “histórico de assédios” do inspetor, que a Investigação Preliminar acabou chegando até as outras vítimas ouvidas. Entre elas aparece outra policial rodoviária federal, que contou se sentir incomodada com os pedidos insistentes do acusado para dar carona ou levá-la para almoçar, além de perguntas indiscretas, como, por exemplo, o dia em que o acusado perguntou se ela teria colocado silicone.

As “caronas” do inspetor também fazem parte do relato de uma adolescente de 16 anos que fazia um estágio na Superintendência mineira da PRF. A menor contou que, um dia, o homem ofereceu para levá-la em casa e ela aceitou. Apesar de nada ter acontecido no dia, ao ser vista chegando com um homem desconhecido a menor foi repreendida pelos pais e, por isso, não aceitou mais os convites do inspetor.

Porém, o policial teria continuado insistindo, até que, um dia, a adolescente estava no ponto de ônibus e o inspetor parou o carro e desceu para “convencer” que ela fosse levada por ele para casa. Foi nesta segunda carona que, no caminho, ainda de acordo com o relato da garota, que o homem teria tirado a arma do coldre e a colocado no colo, além de ter fechado os vidros do carro “que eram muito escuros”. Neste momento, ele teria perguntado qual sua idade, e, após ela dizer que tinha 16 anos, perguntou até quando ela trabalharia na PRF, afirmando em seguida que ela “poderia ficar mais tempo”. A situação e o diálogo teriam a deixado apreensiva, conforme o depoimento, apesar dele não ter tocado nela no caminho.

Outras servidoras civis também denunciaram toques inadequados do policial, sendo que uma delas diz que ele teria apertado sua coxa e, em outra ocasião, colocado a mão na sua barriga e dito que ela estaria “durinha”. Já uma secretária do próprio gabinete afirma ter sido “abraçada” por trás e, ao repreender o inspetor, teria ouvido dele que ela “ficou arrepiada”.

Ainda conforme uma das vítimas, parte dos assédios teriam ocorrido na presença de testemunhas, citando momentos em que o inspetor teria perguntado para colegas policiais se ela seria “sapata” e afirmado que iria “pegá-la”. Apesar do relato citando os nomes dos policiais, que foram indicados como possíveis testemunhas no processo administrativo, nenhum deles foi convocado pela comissão.

Para além das cinco denúncias que envolvem assédios sexuais, uma última funcionária da Superintendência ainda relatou à Corregedoria ter supostamente sofrido perseguição e assédio moral, tendo inclusive sido afastada do trabalho por problemas psicológicos. O possível  tratamento “rude” e “grosseiro” do policial também foi relatado por outras pessoas no processo, sendo apontado como a causa para o setor do chefe de gabinete perder diversos estagiários, que não gostavam da forma que ele os tratava.

Leia a carta aberta na íntegra: 

“Carta aberta

Nós, mulheres policiais, servidoras, estagiárias e terceirizadas da Polícia Rodoviária Federal, vimos por meio desta carta aberta expressar nossa profunda indignação e preocupação com a atual situação de insegurança jurídica que enfrentamos no exercício de nossas funções, especialmente no que diz respeito aos casos de assédio, mais especificamente quanto ao resultado de um processo correcional ao qual figurava como autor um PRF com lotação atual no Gabinete do Superintendente de Minas Gerais.

É com grande consternação que observamos um cenário onde as vítimas de assédio, ao buscarem justiça, frequentemente se veem em uma posição de vulnerabilidade ainda maior. Ao invés de encontrar apoio e proteção, muitas de nós enfrentam processos jurídicos que se voltam contra as próprias vítimas, gerando um ambiente de medo e desamparo.

Esta inversão de valores não só contraria os princípios básicos de justiça e equidade, mas também mina a confiança nas instituições que deveriam zelar pela nossa segurança e dignidade. A situação atual cria uma barreira para que as mulheres denunciem abusos, perpetuando a impunidade e contribuindo para um ambiente de trabalho hostil e insustentável.

A Lei nº 14.540, de 03 de abril de 2023, instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual no âmbito da Administração Pública, direta e indireta, federal, estadual, distrital e municipal. A ControladoriaGeral da União (CGU), por sua vez, elaborou um guia sobre assédio moral e sexual no Governo Federal - o Guia Lilás - contendo orientações sobre o uso adequado e efetivo dos canais de denúncia de atos de assédio e discriminação na administração pública federal.

Exigimos, portanto, a implementação urgente de medidas e diretrizes efetivas que garantam a proteção das vítimas de assédio e assegurem que os perpetradores sejam devidamente responsabilizados por suas ações. É imperativo que as instituições corrijam este curso, proporcionando um sistema de apoio robusto e confiável para todas as mulheres.

Nesse sentido, com o propósito de adequar ao dispositivo legal supracitado, requeremos:

  1. A promoção de uma gestão participativa, com ampliação do diálogo, solidariedade, horizontalidade e transparência, com o objetivo de diminuir as situações de risco para assédio;
  2. A elaboração e divulgação regular de informação sobre a prevenção de assédio a todo o pessoal de todas as categorias profissionais (servidoras, estagiárias e terceirizadas da Polícia Rodoviária Federal);
  3. A divulgação dos canais de denúncia e a criação de mecanismo permanentes de acesso: e-mail específico, contato telefônico, atendimento presencial, chat virtual, QR code, entre outros.
  4. A criação de Comissão de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual, que dentre várias competências, promoveria o acolhimento às agentes vítimas de assédio, através da promoção de política institucional de escuta, acolhimento e acompanhamento das vítimas;
  5. Capacitação de treinamentos regulares e realização de eventos sobre o tema, para que os agentes públicos saibam como identificar e reportar situações de assédio;
  6. O incentivo às abordagens de práticas restaurativas para resolução de conflitos;
  7. Assegurar que os testemunhos das vítimas sejam protegidos pelo sigilo, com o propósito minimizar o “ciclo do silêncio”, causado pelo medo, constrangimento ou vergonha da vítima.
  8. Por fim, a previsão expressa da obrigatoriedade de, pelo menos uma mulher, compor a comissão do Processo Administrativo Disciplinar.


Os assédios moral e sexual não somente ferem suas vítimas de forma cruel, dolorosa e duradoura, mas também contaminam e corroem o ambiente de trabalho. Por isso, seu combate é obrigação de todos e todas, e enseja também uma atuação rápida e efetiva dos gestores e das várias instâncias instituídas como a Ouvidoria, a Comissão de Ética, Direitos Humanos e a Corregedoria.

Não podemos aceitar que a busca por justiça se transforme em um novo tormento para aquelas que já foram vitimadas. Nosso compromisso com a segurança pública e com a justiça deve ser refletido em um ambiente de trabalho seguro e justo para todos, onde a coragem de denunciar seja incentivada e protegida.

Contamos com o apoio e a ação imediata das autoridades competentes para reverter este quadro e restabelecer a confiança e a integridade das mulheres em nosso sistema jurídico.

Atenciosamente,

Mulheres policiais, servidoras, estagiárias e terceirizadas da Polícia Rodoviária Federal” 

Esclarecimentos da PRF

- Qual foi o motivo para o caso, com relatos de pelo menos seis mulheres contra o profissional, ter levado cinco anos para acabar? 

Os principais motivos foram a pandemia de COVID 19, que suspendeu atividades presenciais não-essenciais, conforme orientação da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Corregedoria-Geral da Polícia Rodoviária Federal, decorrentes da edição da MP nº 928/2020, a suspensão dos prazos prescricionais dos processos administrativos, e a movimentação de servidores-membros da comissão processante para exercício de cargos comissionados e para capacitação. 

- Por que a PRF montou uma comissão processante no caso formada exclusivamente por homens?

Na sua composição inicial, a comissão contava com uma servidora PRF, que participou de 20 oitivas, inclusive das denunciantes. A servidora desligou-se da comissão em razão de nomeação para cargo comissionado e a vaga foi preenchida de acordo com a disponibilidade de servidores com capacitação em Processo Administrativo Disciplinar.

- Como a corregedoria pode ter concluído que não havia provas suficientes para inocentar o acusado se, na investigação preliminar, foi pontuado que ficou claro a existência de um padrão nos assédios cometidos pelo suspeito, contra vítimas de diferentes setores e em períodos diferentes? O depoimento das vítimas não deveria ser considerado uma prova em casos de crimes sexuais pela corregedoria, como ocorre na Justiça comum?

A leitura do processo comprova que os depoimentos das testemunhas foram, sim, levados em consideração, devidamente analisados e confrontados com os demais elementos arrecadados. Nos anos de 2022 e 2023, 75% dos Processos Administrativos Disciplinares (PAD) sobre "assédio moral" ou "assédio sexual" no âmbito das Corregedorias da Polícia Rodoviária Federal resultaram em responsabilização disciplinar dos autores ou em Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Nesse biênio, foram aplicadas cinco sanções em oito procedimentos instaurados, sendo uma demissão e quatro suspensões, além de ajustamento de conduta em outro procedimento, acarretando arquivamento em dois daqueles instaurados.

No processo administrativo, há diferença entre os procedimentos ‘preliminar’ e ‘contraditório’. No primeiro, verificam-se os indícios que fundamentam a abertura do processo em si, que não são submetidos ao contraditório, enquanto no segundo buscam-se os elementos probatórios capazes de sustentar, ou não, os indícios apresentados inicialmente. O investigado pode, inclusive, não saber que está sob investigação. O processo então investiga, analisa, cruza e compara os indícios arrecadados, produz novos elementos, se necessário, e os interpreta e avalia, com atenção ao princípio de presunção da inocência, de forma que eventual responsabilidade e punição passam pela verificação e comprovação dos fatos narrados. 

- O servidor denunciado recebeu alguma punição ou, ao menos, treinamento acerca de assédio moral e sexual? Ele segue lotado na superintendência?

O servidor não foi penalizado, o procedimento foi arquivado e o servidor não passou pelos procedimentos mencionados.

- Porque parte das testemunhas arroladas pelas vítimas não foram ouvidas no processo?

De acordo com o Relatório Final da Comissão de Processo Administrativo e Disciplinar, todas as testemunhas indicadas tanto pelas vítimas quanto pela defesa foram ouvidas no bojo da apuração. No decorrer do processo, houve a desistência de um servidor. No mais, foram ouvidas todas as pessoas mencionadas pelas testemunhas arroladas. A produção das provas passa pelo crivo dos integrantes da comissão, que possuem legalmente independência para avaliar a pertinência daquelas provas que se pretende produzir.

- O processo dedicou dezenas de páginas para contestar os depoimentos de cada uma das vítimas. A Corregedoria não considerou que, em casos de assédio no trabalho, especialmente envolvendo pessoas de hierarquia superior, é comum que, após uma primeira denúncia, surjam novas vítimas? 

A razão de existir das Corregedorias é apurar e responsabilizar, com o rigor da lei, toda e qualquer conduta de servidor incompatível com a dignidade da função pública, seja contra também servidor, seja contra qualquer pessoa que se sinta violada em seus direitos fundamentais. E para isso existe o devido processo legal, que instruído à luz dos fatos, das provas e da lei, assegurado o amplo direito de defesa. É a esses aspectos que deve se ater. Todas as unidades da PRF mantêm canais para recebimento de denúncias ou representação que envolva não só a temática do assédio sexual ou moral, mas também qualquer outra de viés disciplinar. No caso do processo referido, após o julgamento do feito, que se deu com a publicação da decisão administrativa, não houve apresentação formal de protesto ou manifestação de inconformação por parte da representante quanto ao desfecho do processo. Por fim, cabe destacar que o PAD em comento foi acompanhado desde o seu início pelo Ministério Público Federal em Minas Gerais, tendo aquele Parquet conhecimento de sua tramitação e conclusão desde que os atos foram produzidos.

- Existe a possibilidade desse processo interno ser novamente aberto? Se isso ocorrer, mulheres farão parte da comissão? 

Para a reabertura de processo administrativo concluído e arquivado é necessária a apresentação de fato novo, conforme determina o artigo 174 da Lei 8112/90. Quanto à participação de mulheres na Comissão, a definição dos integrantes responsáveis pela condução do processo observará a presença de servidoras em sua formação. Sobre a apresentação de defesa e testemunhas por parte das eventuais vítimas, essa somente é possível ao acusado ou acusada no procedimento, sendo franqueado ao representante ou denunciante a exposição dos fatos de forma oral ou escrita, arrolando as testemunhas relativas, sem prejuízo de outros elementos não vedados pelo ordenamento jurídico.

- A PRF pretende, após a exposição do caso, fazer algo para mudar essa política com relação ao assédio sexual e moral dentro da corporação? 

Enquanto órgão de segurança pública sob a hierarquia do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), a atual gestão da Polícia Rodoviária Federal vem cotidianamente trabalhando para a conscientização, enfrentamento e combate a todos os tipos de assédio, seja dentro ou fora da instituição, em total sincronia com  as políticas públicas sobre o tema. Nesse cenário, destacamos a recente publicação do Plano de integridade PRF, que pontualmente prevê a atualização da política de abordagem e Direitos Humanos e a criação da política de enfrentamento a todos os tipos de assédio como pautas prioritárias. Consciente da sensibilidade do tema, especialmente para uma organização com público majoritariamente masculino, a gestão da PRF está trabalhando em todas as suas áreas para o fortalecimento da cultura de integridade voltada ao respeito e à valorização da diversidade, tudo em sintonia com a proteção e a defesa dos Direitos Humanos, área que foi totalmente reformulada e fortalecida, tanto da Direção-Geral quanto dos estados. Como exemplo concreto, temos a campanha institucional “integridade é um valor PRF”,  na qual cards com o tema foram difundidos a toda instituição, inclusive nos estados.

Reiteramos que a Polícia Rodoviária Federal não compactua com desvios de conduta de qualquer natureza por parte de seus servidores, sendo todas as denúncias apuradas e punidas com o rigor da lei e o respeito ao direito de defesa. A PRF dá apoio incontestável à proteção dos Direitos Humanos de seus servidores e da sociedade, sendo referência nacional ao combate à exploração sexual de crianças e adolescentes com o Prêmio Nacional de Direitos Humanos e o reconhecimento da Organização das Nações Unidas.

Fonte: O Tempo

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