A Justiça do Trabalho manteve a justa causa aplicada a um médico em Belo Horizonte após ele deixar um paciente esperando na sala de cirurgia do hospital, por 40 minutos, enquanto dormia na área de descanso. A decisão é dos julgadores da Décima Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), que mantiveram a sentença da 38ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte.
O médico foi dispensado com base no artigo 482, alínea “e”, da CLT, que prevê a justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador em casos de “desídia no desempenho das respectivas funções”. No processo trabalhista, o profissional contou que, após encerrar uma longa cirurgia em março de 2023, foi informado pela chefia do bloco cirúrgico que teria um segundo procedimento, “mas que era necessária a esterilização da sala”. Segundo o médico, na sequência, ele recebeu uma ligação dizendo que o próximo paciente já estava na sala aguardando, mesmo sem a autorização, desrespeitando então um procedimento padrão do hospital.
Por esse motivo, o médico informou que terminaria de se alimentar para voltar e avaliar o paciente, pois não havia sequer recebido o prontuário. Contudo, segundo o profissional, ao retornar ao bloco, foi informado de que o paciente já havia sido retirado da sala. Já o hospital negou judicialmente a versão do cirurgião, alegando que “restou comprovado na sindicância realizada que ele sabia da cirurgia e não atendeu às ligações do bloco, por estar com o telefone fora de área”. Além disso, o empregador alegou que ficou claro no processo que a sala estava sendo preparada para o procedimento cirúrgico e que, apesar de ter sido informado, o médico não quis retornar.
Para o médico, o hospital não conseguiu provar as acusações. Além disso, ele argumentou que a testemunha ouvida apresentou informação falsa, “o que coloca em dúvida todo o depoimento”. Quanto à sindicância realizada para apurar os fatos, o cirurgião disse que não serve como prova, já que foi feita sem a ampla defesa e o devido processo legal.
Ao avaliar o caso, o desembargador relator Marcus Moura Ferreira deu razão ao hospital, mantendo a sentença da 38ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Segundo o julgador, a sindicância seguiu todos os ditames necessários, ouvindo, no início, a versão apresentada pelo médico. Além disso, o relator entendeu não haver elemento que fragilize as declarações da testemunha, “em que pese a tentativa do reclamante de desqualificar o depoimento”.
A testemunha, que é supervisora do centro cirúrgico, contou judicialmente que, após ser notificada do atraso, pediu a uma técnica que ligasse para o profissional, mas o telefone estava fora de área. Contou que foi então até o quarto de descanso e verificou que o médico estava dormindo. Disse que chamou pelo nome do médico e informou que o paciente estava na sala de cirurgia há 40 minutos aguardando.
Segundo a testemunha, ele respondeu que estava no horário de almoço. Ela contou que perguntou então ao médico se ele não desceria para a cirurgia. Segundo ela, o médico respondeu: “Não, vou terminar meu horário”. A supervisora informou no depoimento que explicou a ele que, dessa forma, teriam que cancelar a cirurgia. Em seguida, o médico respondeu: “Então cancele”. A testemunha disse que comunicou o fato à equipe do hospital, incluindo o coordenador da ortopedia, via WhatsApp.
Segundo o desembargador relator Marcus Moura Ferreira, o depoimento da supervisora do centro cirúrgico foi confirmado pelas informações prestadas pela técnica de enfermagem que acompanhava o procedimento. Foi ela, inclusive, quem informou à supervisora sobre a ausência do médico na sala de cirurgia.
Além disso, o julgador ressaltou que a mensagem de WhatsApp, anexada ao processo, e as imagens das câmeras de segurança ratificam a versão apresentada pela empregadora. Pelas imagens, é possível verificar que o cirurgião entrou na sala de descanso médico às 10h47. Já a supervisora chega à sala às 11h46 e sai às 11h47.
Logo depois, às 11h51, o médico sai da sala de descanso em direção ao vestiário, onde permanece até às 12h22, retornando novamente à área do descanso médico, de onde sai às 12h31. A sindicância também constatou que, naquele dia, o cirurgião encerrou a jornada de trabalho às 12h35. Para o julgador, a alegação do médico de que não teria autorizado o encaminhamento do paciente ao centro cirúrgico não se sustenta. “Ainda que não o tivesse feito, ele possuía plena ciência de que a cirurgia seria realizada e, mesmo após alertado de que o paciente já estava aguardando, há 40 minutos, não se dirigiu à sala cirúrgica, o que demonstra completo desrespeito com o paciente em questão e com a equipe envolvida, que se encontrava de prontidão”, ponderou.
O magistrado ressaltou ainda na decisão que o cirurgião estava submetido a uma jornada de seis horas diárias, fazendo jus a apenas 15 minutos de intervalo intrajornada. “Não há como acolher a tese de que, naquele dia, a jornada se estenderia e, por isso, ele teria direito ao intervalo de uma hora. Em depoimento prestado durante a sindicância, ele afirmou que não sabia qual seria a extensão da cirurgia”.
Fonte: O Tempo