Festival comemora 40 anos como um dos maiores do mundo, ao mesmo tempo em que acumula polêmicas e situações inusitadas
Lobão, Cazuza, Carlinhos Brown, Elton John, Metallica e Freddie Mercury protagonizaram momentos históricos do Rock in Rio (Foto/Montagem/Reprodução)
Quando surgiu, há quarenta anos, o Rock in Rio parecia uma miragem no horizonte, logo tomado por um lamaçal que conferiu contornos ainda mais roqueiros e expressionistas àquela celebração da rebeldia em território tupiniquim. Ao longo das décadas, o festival se consagrou como um dos maiores do mundo, ao mesmo tempo em que acumulou polêmicas e curiosidades. Relembramos algumas delas logo abaixo.
Do pioneirismo ao retorno
Em 1985, Ney Matogrosso já estava na estrada em carreira solo há uma década, depois do estouro com o grupo Secos & Molhados nos anos 1970. Ney abriu a primeira edição do Rock in Rio, mas a ousadia carnavalizante e o rebolado do cantor não cativaram o público, ávido pelas atrações internacionais e pelo som pesado dos metaleiros.
A passagem conturbada de Ney pelo festival não parou por aí. Reza a lenda que, nos bastidores, ele se desentendeu com Freddie Mercury, a estrela de conhecido temperamento difícil do grupo Queen. Em 2024, Ney está de volta ao Rock in Rio, assim como Lulu Santos e Os Paralamas do Sucesso, que também tocaram na primeira edição, consagrando o pioneirismo com tais retornos.
Brasileiros se salvam das vaias
A edição de 1985 do Rock in Rio também ficou marcada pela desmoralização das atrações brasileiras, tanto no palco quanto fora dele. Ao longo dos anos, inúmeras reclamações sobre as diferenças de cachê, tratamento, equipamento e qualidade técnica do som, privilegiando os estrangeiros em detrimento da prata da casa, vieram à tona.
O público também chiou quando artistas como Eduardo Dussek, Alceu Valença, Erasmo Carlos, Kid Abelha, dentre outros, subiram ao palco, oferecendo canções de sucesso muito distantes do som pesado ansiado pela multidão. Dos brasileiros, apenas o Barão Vermelho comandado por um energizado Cazuza e Os Paralamas do Sucesso de Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone escaparam às vaias dos presentes à Cidade do Rock naquele marcante ano de 1985…
Reações diferentes
Lobão não costuma cumprir expectativas. O polêmico artista é habilidoso em surpreender o público. Fato é que o artista está muito longe de ser previsível, o que pode ser entendido como uma qualidade em seu ofício. Em 1991, o Rock in Rio ainda estava distante de abraçar a diversidade que daria o tom de edições posteriores, quando Lobão decidiu tomar o palco acompanhado pela bateria da Estação Primeira de Mangueira.
Não houve nem tempo para reação e o público começou a arremessar latas de cerveja contra o palco. Lobão vociferou xingamentos e encarou a plateia antes de abandonar o show. Já em 2001, ao ser atacado por centenas de garrafas d’água em sua direção, Carlinhos Brown pediu paz, mas não foi atendido. E esses famosos episódios de intolerância cessaram em edições posteriores.
O maior cachê para o maior show
A voz aguda e afiada como uma lâmina contrastava com o corpo imponente e musculoso sobre o palco. Mas tudo em Freddie Mercury era contraste. O uso do bigode passou a ser uma marca registrada entre os gays a partir de sua aparição, embora ele mesmo jamais tenha definido sua sexualidade.
Metade da fortuna que acumulou, em pouco menos de duas décadas de estrada, ficou com a ex-namorada, para quem dedicou “Love of My Life”, uma das músicas mais sensíveis do repertório do Queen, cantada por uma multidão de vozes regida pelo vocalista na edição de 1985 do Rock in Rio, quando o grupo faturou também o maior cachê pago pelo evento. Nada menos do que 1,2 milhão de dólares…!
Tocando de graça
Não é incomum, para artistas que estão começando, a recorrente proposta de tocar de graça. Ironicamente, isso também aconteceu no Rock in Rio. Enquanto as atrações internacionais embolsaram polpudas quantias de dinheiro, muitos artistas tupiniquins foram tratados como autênticos iniciantes. Grupos como Nenhum de Nós e Inimigos do Rei foram alguns que aceitaram subir ao palco sem cachê.
O mesmo ocorreu com os cantores Paulo Ricardo, oriundo do RPM, e Supla, depois de um início de carreira como vocalista da banda Tokyo. O filho dos políticos petistas Eduardo Suplicy e Marta Suplicy, no entanto, aproveitou a exposição do festival para assinar um contrato com a EMI-Odeon, gravadora com poder no mercado.
Nudez
Em 2001, Cássia Eller protagonizou um show histórico no Rock in Rio, sacudindo a plateia com uma performance roqueira que teve direito até à presença de seu filho Chicão na bateria, durante um clássico do Nirvana. Ela também levantou o público com músicas da Nação Zumbi e dos Beatles. Em outro momento provocador, Cássia mostrou os seios, o que se tornou uma de suas marcas registradas em shows, exibindo todo seu deboche.
Na mesma edição do Rock in Rio, o baixista do Queens of the Stone Age, Nick Olivieri, tocou inteiramente nu, protegendo suas partes íntimas dos olhares mais curiosos apenas com o corpo do próprio instrumento. No final do show, ele foi detido pela polícia por “praticar ato obsceno”, mas acabou solto na mesma noite.
Dia de rock e Elton John
A era dos memes ainda estava em sua fase incipiente quando a experiente atriz Christiane Torloni caiu na boca do povo durante a sua participação, como entrevistada, na cobertura do Rock in Rio de 2011. Foi na ocasião que ela, visivelmente empolgada – para dizer o mínimo –, soltou a pérola “hoje é dia de rock, bebê!”, que se transformou, instantaneamente, em um clássico das redes sociais.
Embora estivesse se divertindo com as atrações pop do festival, Christiane Torloni deixou claro que estava lá para conferir a apoteótica apresentação de Elton John. Famoso pelas extravagâncias, o icônico artista também invadiu as manchetes sensacionalistas ao pedir um “sanduíche de atum com salada de ovo” em seu camarim.
Recorde metaleiro
Transmitido ao vivo pelo YouTube, o show do grupo Metallica no Rock in Rio de 2011 fez jus à expressão “arrasa-quarteirão”, quando foi assistido por 3 milhões de espectadores em mais de 200 países, um recorde absoluto que ultrapassou, inclusive, outros festivais de música pelo mundo. A passagem do grupo de metaleiros pelo Brasil não ficou marcada somente pelo recorde.
Na ocasião, Kirk Hammett ainda dedilhou “Samba de Uma Nota Só” na guitarra, subvertendo a previsibilidade desse clássico de Tom Jobim, em parceria com Newton Mendonça, e da música brasileira, gravado por nomes como João Gilberto, Sylvinha Telles e Nara Leão.
Fonte: O Tempo