Plataformas receberam R$ 27 mi nas eleições deste ano, contra R$ 10 mi em 2020. Para especialistas, propaganda digital é inevitável e vai além das eleições
Campanhas digitais: Atuação de candidatos nas redes sociais vem aumentando a cada eleição (Foto: Getty Images)
Os candidatos a prefeitos e vereadores em Minas Gerais quase triplicaram os investimentos em redes sociais durante as campanhas de 2024, em relação às eleições municipais de 2020. No pleito deste ano, foram destinados cerca de R$ 27 milhões apenas em impulsionamento de conteúdo, um salto em relação aos R$ 10 milhões investidos em 2020, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgados até 13 de novembro. Os números estão em atualização por causa dos processos de prestação de contas.
A Meta (antigo Facebook) foi a maior beneficiada, recebendo quase R$ 17 milhões, o que reflete a crescente atuação das plataformas digitais na comunicação política. Especialistas ouvidos por O TEMPO apontam que, além das campanhas, os investimentos nas redes sociais seguem em alta fora dos períodos eleitorais, com destaque para o uso por políticos de direita.
O impulsionamento de conteúdo ocorre por meio de anúncios pagos para que determinadas publicações alcancem um maior número de pessoas, especialmente para aquelas que não estão na lista de seguidores do perfil da rede social. A Justiça Eleitoral permite essa ação nas campanhas eleitorais, e as despesas entram na conta final dos gastos dos candidatos.
Por agrupar diferentes plataformas, como Facebook, Instagram e WhatsApp, é comum que a Meta concentre a maior parte dos investimentos. Com os quase R$ 17 milhões de campanhas eleitorais destinados à empresa neste ano, o Facebook – plataforma que gerencia os anúncios da Meta – está no topo da lista dos maiores fornecedores de serviços para candidatos nos municípios de Minas. O número mais que quadruplicou em comparação com 2020, quando o Facebook recebeu cerca de R$ 3,8 milhões dos postulantes a um cargo político em Minas Gerais.
Atualmente, há uma disseminação das dinâmicas das plataformas digitais em diversas esferas da sociedade, fenômeno conhecido como “plataformização”, como explica a doutora em ciências da comunicação pela ECA-USP Issaaf Karhawi. O conceito, segundo ela, já foi amplamente discutido na questão do trabalho, considerando, por exemplo, a atuação de entregadores e motoristas por aplicativo. Entretanto, o debate vem se ampliando para outros ramos e atividades, como a cultura e a política.
“Temos uma discussão importante sobre ‘plataformização’ da política quando olhamos, por exemplo, para figuras como a (deputada federal) Erika Hilton (PSOL-SP), que construiu uma presença digital respondendo, exatamente, ao desenho das plataformas, desde viralização até os próprios formatos de cortes, uso de humor, da cultura pop. Isso já é algo que aparece na política, e seria estranho se não estivesse também presente nas campanhas eleitorais”, explica Issaaf.
Há, ainda, uma dinâmica de que essas plataformas seriam “incontornáveis”, ou seja, atualmente não é possível pensar em comunicação fora do contexto digital, conforme a especialista. Nesse sentido, segundo Issaaf, a tendência das figuras políticas é buscar entender onde o eleitor está e qual a sua dinâmica de consumo, ou “dieta midiática”.
Mídias digitais são ‘acréscimos’ aos meios tradicionais
Apesar de o investimento em impulsionamento nas redes sociais ter aumentado consideravelmente nas eleições de 2024, este não foi o maior gasto dos candidatos em Minas. A publicidade por materiais impressos ainda lidera a lista de despesas, com quase R$ 130 milhões. Porém, a proporção de crescimento dessa modalidade não foi tão alta em comparação com as eleições municipais de 2020, quando foram usados pouco mais de R$ 78 milhões. Ou seja, não chegou nem a dobrar em relação ao que havia sido gasto anteriormente.
Conforme o mestre em ciência política Lucas Zandona, professor da Estácio BH, as redes sociais surgem como um “acréscimo” aos métodos de campanha tradicionais, mas não os substituem. Como lembrado pelo especialista, o Brasil tem 155 milhões de eleitores, enquanto a rede social com maior número de usuários, o WhatsApp, tem cerca de 147 milhões de pessoas cadastradas. Ou seja, ainda há um grande número de eleitores que não necessariamente estão inseridos no digital, o que demonstra que as demais estratégias eleitorais ainda produzem efeito.
Um exemplo que demonstra a limitação da influência das redes sociais é a eleição para prefeito em Belo Horizonte. No segundo turno, o pleito foi disputado entre os candidatos mais e menos populares nas plataformas. O deputado estadual Bruno Engler (PL) tinha 20 vezes mais seguidores que o prefeito e candidato à reeleição, Fuad Noman (PSD). No final, o atual chefe do Executivo saiu vitorioso nas urnas.
“Eleitores que têm uma grande atuação em redes sociais também farão engajamento para os seus candidatos. Mas isso não pressupõe que ele fará um engajamento pessoal e presencial para cooptar votos para esse candidato, ou seja, seria uma mobilização tão somente em redes sociais”, aponta Zandona.
Sozinho, investimento na web não garante vitória
Na avaliação do cientista político e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Paulo Roberto Figueira Leal, o crescimento de gastos em redes sociais durante as campanhas eleitorais segue uma tendência de investimento publicitário e a possibilidade de chegar a nichos específicos do eleitorado. Apesar disso, as plataformas são mais um elemento a ser considerado na campanha, mas não excluem as estratégias tradicionais, como impresso, televisão e rádio, por exemplo.
“Em um país como o nosso, em que 97% dos lares brasileiros têm acesso à TV aberta, em que ainda há milhões de pessoas não conectadas a redes ou com pacotes com baixo acesso a esses ambientes, é obviamente impossível dizer que essas plataformas são a variável-chave para vencer. Podem ser em certos contextos, podem não ser em outros. Ninguém pode ficar fora delas, mas ninguém pode achar que apenas elas resolvem o resultado”, diz o professor da UFJF.
Fonte: O Tempo