Advogados do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), disseram que “não passam de desabafos” os áudios em que ele critica a Polícia Federal (PF) e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), divulgados na noite de quinta-feira (21) pela revista Veja.
Para a defesa, as declarações de Mauro Cid nos áudios enviados a um amigo por meio de Whatsapp, “não comprometem a lisura, seriedade e correção” da delação firmada pelo militar com a PF, sob respaldo da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do STF.
“Os referidos áudios divulgados pela revista Veja, ao que parecem clandestinos, não passam de um desabafo em que relata o difícil momento e a angústia pessoal, familiar e profissional pelos quais está passando, advindos da investigação e dos efeitos que ela produz perante a sociedade, familiares e colegas de farda”, dizem os advogados no comunicado.
“Mauro César Babosa Cid em nenhum momento coloca em xeque a independência, funcionalidade e honestidade da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República ou do Supremo Tribunal Federal na condução dos inquéritos em que é investigado e colaborador, aliás, seus defensores não subscrevem o conteúdo de seus áudios”, prossegue a nota.
Por fim, o texto, assinado por todos os advogados de Cid, reforça que “de forma alguma, comprometem a lisura, seriedade e correção dos termos de sua colaboração premiada firmada perante a autoridade policial, na presença de seus defensores constituídos e devidamente homologada pelo Supremo Tribunal Federal nos estritos termos da legalidade”.
O “desabafo” ocorreu após Cid, Bolsonaro e outras 15 pessoas serem indiciadas no inquérito que apura suposto plano de tentativa de golpe de Estado que visava impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PL) para manter o ex-presidente no poder. A trama incluiria a prisão de Alexandre de Moraes.
Juiz auxiliar deve ouvir Mauro Cid nesta sexta-feira
Por causa dos áudios divulgados pela Veja, Mauro Cid deve ser ouvido nesta sexta-feira (22) pelo juiz instrutor do gabinete de Alexandre de Moraes. A PF já levanta a possibilidade de anulação do acordo de delação premiada do tenente-coronel. Desde que fechou o acordo, em setembro do ano passado, ele já prestou seis depoimentos.
Investigadores ressaltam que os depoimentos de Cid são apenas parte do conteúdo de provas contra os investigados. No relatório final do caso, apresentando à PGR e ao STF, a PF apresentou uma série de evidências, que corroboram as declarações de Cid e outras testemunhas.
Entre elas estão cópias de trocas de mensagens dos investigados, documentos, arquivos de computadores e de celulares, vídeos e comprovantes de entrada e saídas dos locais onde os indiciados estiveram para tratar da suposta trama golpista.
Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF após ficar preso por 129 dias. Ele foi preso no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças.
O tenente-coronel é figura central das investigações que miram Bolsonaro e seus aliados. Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF após ficar preso por 129 dias. Ele foi preso no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças.
Ao fechar o acordo e se comprometer a dizer a verdade, o colaborador consegue vantagens, como tempo de pena menor caso seja condenado. Além do caso das vacinas, a delação de Cid embasa outras apurações, como a que apura uma trama de golpe de Estado e das joias sauditas que envolvem o ex-presidente e a mulher, Michelle Bolsonaro.
Mauro Cid fala em ‘narrativa pronta’
De acordo com a reportagem da Veja, a gravação em que Mauro Cid ataca a PF e Moraes foi realizada na semana passada, depois que o tenente-coronel prestou depoimento à PF no último dia, e que durou 9 horas.
O militar diz que os inquéritos já possuem “narrativa pronta”. Ele afirma que foi pressionado a relatar fatos que não aconteceram e detalhar eventos sobre os quais não tinha conhecimento. “Eles (os policiais) queriam que eu falasse coisa que eu não sei, que não aconteceu”, disse em um primeiro áudio.
“Não adianta. Você pode falar o que quiser. Eles não aceitavam e discutiam. E discutiam que a minha versão não era a verdadeira, que não podia ter sido assim, que eu estava mentindo”, completou.
“Eles estão com a narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam só que eu confirmasse a narrativa deles. Entendeu? É isso que eles queriam. E todas as vezes eles falavam: Ó, a sua colaboração está muito boa’. Ele (o delegado) até falou: ‘Vacina, por exemplo, você vai ser indiciado por nove negócios de vacina, nove tentativas de falsificação de vacina. Vai ser indiciado por associação criminosa e mais um termo lá’. Ele falou assim: ‘Só essa brincadeira são trinta anos para você’.”
Mauro Cid diz que a ‘a lei já acabou’
Em outro áudio, ele ainda critica Alexandre de Moraes, dando a entender que o ministro, que é relator de diversos casos no Supremo que miram o ex-presidente, quer prender Bolsonaro.
“A lei já acabou há muito tempo. Eles são a lei. O Alexandre de Moraes é a lei. Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem acusação”, diz.
O tenente-coronel ainda fala para o amigo que a PF tem feito uma filtragem das informações que estão sendo oficializadas na delação. Segundo Cid, encontro entre Moraes e Bolsonaro, não foi registrado nos depoimentos.
“Eu falei daquele encontro do Alexandre de Moraes com o presidente, eles ficaram desconcertados, desconcertados. Eu falei: ‘Quer que eu fale? Eu não vou botar no papel porque senão eu vou me f*****, mas o presidente encontrou secretamente com Alexandre de Moraes".
As críticas contra Moraes continuam, com o Cid dizendo que o ministro do STF “já tem a sentença dele pronta”. “Acho que essa é que é a grande verdade. Ele já tem a sentença dele pronta. Só tá esperando passar um tempo. O momento que ele achar conveniente denuncia todo mundo, o PGR acata, aceita e ele prende todo mundo”.
‘Bolsonaro ficou milionário’ e ‘eu me f****”, diz Mauro Cid
Ainda nos áudios, Mauro Cid fala da situação em que se tornou “traidor” e, desde então, tem o nome envolvido em manchetes diariamente. “Quem mais se f**** fui eu. Quem mais perdeu coisa fui eu. Pensa todo mundo aí. Ninguém perdeu carreira, ninguém perdeu vida financeira como eu perdi. Todo mundo já era quatro estrelas, já tinha atingido o topo, né?”.
Ele também diz que Bolsonaro ficou milionário com a ajuda de apoiadores. “O presidente teve Pix de milhões, ficou milionário, né? “Para político é até bom essas p***** porque eles até conseguem se eleger fácil. O único que teve pai, filha, esposa envolvido, o único que perdeu a carreira, o único que perdeu a vida financeira toda fui eu”, desabafou.
Para explicar o motivo que fechou o acordo de delação premiada, o tenente-coronel fala que senão fizesse isso, iria pegar “30, 40 anos de prisão porque eu estou em vacina, eu estou em joia”. Ele ainda acredita que as investigações vão continuar avançando e todos que estão de certa forma envolvidos vão ser condenados.
“Vai entrar todo mundo em tudo. Vai somar as penas lá, vai dar mais de 100 anos para todo mundo. A cama está toda armada. E vou dizer: os bagrinhos estão pegando 17 anos. Teoricamente, os mais altos vão pegar quantos?”.
Fonte: O Tempo