Dos diversos trabalhos efetuados pelo historiador Hildebrando Pontes (1879-1940), um dos mais significativos e importantes constitui o levantamento da legislação municipal (leis, resoluções, portarias e decretos), de março de 1892 a abril de 1934.
Não o fez de período anterior, porque, conquanto Uberaba tivesse Câmara de Vereadores desde 7 de janeiro de 1837, à época, conforme lei federal de 1828, regulamentadora da competência e atribuições das Câmaras Municipais, estas só tinham Poder Executivo, acometida a função legislativa às assembleias provinciais.
Com o advento da República, que implementou o regime presidencialista no país nos níveis federal e estadual, as organizações municipais permaneceram parlamentaristas, englobando, porém, a partir da primeira Constituição republicana, atribuições executiva e legislativa, pelo que a primeira lei municipal de Uberaba, ou de nº 1, é datada de 22 de março de 1892.
O levantamento procedido por Hildebrando, a par de organizado, sistemático e cronológico, contém numeração, datação e ementário dessa legislação realizados com responsabilidade, competência e consciência, como tudo o que fazia e fez.
A perquirição e o acompanhamento desse inventário revelam, passo a passo, lei por lei, as necessidades, problemas e questões provocadas pela introdução de novas tecnologias e meios de transporte, a exemplo da iluminação da cidade (leis nº 59/1898, nº 70, 108 e outras até as 186 e 188/1905), automóveis (leis nº 191/1906 e 425/1919), telefones (Lei nº 193/1906), máquina fotográfica (Lei nº 221/1908) e bondes (Lei nº 306/1913).
A respeito de alguns dos problemas que então atormentavam a municipalidade e seus munícipes, salientam-se os formigueiros (leis nº 113/1901 e 326/1914), cães (Lei nº 298/1913), destes, regulamentando sua matança, tais e tantos infestavam as ruas e atacavam os transeuntes, a ponto de Uberaba mandar ao Instituto Pasteur de São Paulo mais pacientes do que todo o Estado de São Paulo, o que fez Orlando Ferreira, o Doca, em Terra Madrasta (1926) terminar a análise e o rol de realizações de cada administração municipal com a informação “e matar cachorros”.
Ao mesmo tempo que a municipalidade enfrentava essas e outras atribulações, não menores eram as ocasionadas pela permanência (e insistência) de meios e modos do passado, como cadeiras nas calçadas, gado e carros de bois nas ruas, regulamentados pelas leis nº 238/1909, 342 e 343/1915 e 241/1913.
A par disso e de outras questões, essa legislação demonstra a evolução das medidas tomadas com a implementação de cemitério, mercado, água e esgoto, biblioteca, fazenda modelo (já naquele tempo!), indústrias, comércio, perímetro da cidade, urbanização, lixo para fins industriais (já naquela época!) e cessão de terrenos ao Estado para construção do Fórum e da Escola Normal, bem como doação de parte da praça Aristides Borges (atual Santa Teresinha) para construção da igreja (Lei nº 549/1927), e atinente a multas derivadas da “lei das fachadas” (Lei nº 656/1929).
Entre questões inusitadas, salientam-se a referente à visita de ministro da França (Lei nº 211/1907) e à cassação dos poderes de agente executivo (Lei nº 122/1902).
Numa demonstração do volume já considerável e da multivariedade dessa legislação, a Lei nº 371/1916 determina sua consolidação.
Características do momento conturbado em que passava o país, o Governo Civil Municipal estabelecido pelo Golpe de 1930 (denominado comumente de Movimento e até de Revolução) expediu série de portarias para atender e regulamentar as emergências surgidas na ocasião, seguidas por decretos após a instituição do regime de prefeituras, em 24 de novembro de 1930.
Esse notável trabalho de Hildebrando compõe capítulo da História de Uberaba e a Civilização no Brasil Central e, também, edição distinta, ambas as publicações constantes do blog Bibliografia Sobre Uberaba, acessado pelo Google.
Guido Bilharinho
Advogado em Uberaba e editor das revistas culturais eletrônicas Primax (Arte e Cultura), Nexos (Estudos Regionais) e Silfo (Autores Uberabenses)