Apesar das desigualdades e do racismo, empreendedores negros mostram força em Uberaba

A presença negra em espaços de poder, liderança e empreendedorismo ainda é minoria no Brasil, mas cresce com força e resistência. Em meio a desigualdades históricas e ao racismo estrutural, trajetórias como as de Mateus Morais e Rosy Oliveira revelam não só a luta, mas também a potência de homens e mulheres negros que transformam seus caminhos em inspiração. Neste mês de maio, o Jornal da Manhã produz material especial no combate ao racismo em Uberaba, com o apoio da Câmara Municipal.

Filho de uma dona de casa e de um servidor público municipal, Mateus Morais começou sua carreira na área do Direito e hoje é empresário, professor e diretor de uma escola náutica. “Minha inspiração foi meu pai, que me mostrou que estudar era o primeiro caminho para a vitória. Assim como aconteceu com Dr. Wagner do Nascimento, um negro que se destacou em Uberaba, enfrentou muitas adversidades e conseguiu ser prefeito e deputado”, conta.

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A realidade da educação e o acesso desigual às oportunidades também marcaram a trajetória de Mateus. “Frequentei uma universidade federal por meio da cota racial. Vim de uma escola pública onde não havia o mínimo de estrutura para que um ser humano conseguisse concluir seus estudos. Sendo docente hoje, vejo o quanto o negro ainda sofre com a desigualdade de tratamento nas escolas. Isso mexe com o psicológico da pessoa negra. O bullying persiste e a desistência dos estudos, também. E o fato de sermos maioria entre os que desistem da Educação Básica mostra o quanto é urgente investir em políticas públicas voltadas à população negra, que incentivem a permanência, e não a desistência”, destaca.

Mateus atua em instituições tradicionalmente dominadas por homens brancos, como a Marinha e clubes sociais. Para ele, ocupar esses espaços é um ato de enfrentamento cotidiano. “A sociedade, quando se depara com um negro se destacando, tenta diminuí-lo. Se a sua empresa se destaca, procuram desmerece-lo. Se você reclama, está de mimimi. Mas temos de ter coragem de enfrentar essas situações que estão no nosso dia a dia”, afirma o instrutor naval.

Com uma perspectiva semelhante, Rosy Oliveira trilhou um caminho de dor e reconstrução. Após perder parte da visão e se submeter a uma cirurgia ocular, buscou novas formas de manter sua renda e encontrou na estética capilar um novo propósito. “Com essa mudança, encontrei na carreira empreendedora da estética capilar uma maneira de focar na autoestima do meu povo. Ao longo desse processo, percebi uma caminhada que atua diretamente no direito dos negros de se sentirem lindos como são, valorizando a essência natural e bela do povo preto”, explica.

A vivência no salão revelou a Rosy um preconceito ainda muito presente: a rejeição à estética negra, especialmente ao cabelo afro. “Ainda hoje percebo muito preconceito com o cabelo afro, que muitas vezes não é observado por sua beleza estética, mas na condução de um racismo que está estruturado na própria sociedade que molda como devemos nos sentir diante de nossos corpos. Além de um processo de beleza, a naturalização de nosso cabelo aponta para aspectos políticos no sentido de que não permitimos mais o aprisionamento que foi estabelecido ao longo da história”, destaca a empresária.

Apesar dos obstáculos, ambos seguem firmes em seus propósitos. Mateus reconhece que, por vezes, a luta é exaustiva, mas insiste que ela é necessária e precisa ser contínua. “Já nascemos num mundo preconceituoso. Vamos lutar por espaços em que a pessoa negra tenha condições de disputar o mercado de trabalho de igual para igual, sem que a cor da pele seja usada como critério para uma boa escolha”, finaliza.