Pai acusa racismo estrutural na decisão que impediu o nome, que promove o resgate da ancestralidade africana
Casal decidiu colocar o nome do filho de Piiê como forma de resgatar a ancestralidade africana (Foto/Arquivo pessoal)
Uma família de Belo Horizonte promete lutar na Justiça para conseguir o direito de chamar o filho de Piiê, nome que homenageia um faraó negro do povo cuxita, no Egito, originário de um dos primeiros reinos da África. Segundo o pai da criança, Danillo Prímola, tanto o cartório quanto a Vara de Feitos Públicos de BH negaram o pedido, argumentando supostos constrangimentos futuros para a criança, que há dez dias.
Danilo explica que o nome carrega profundo significado histórico e cultural, com referências à resistência e ao resgate da ancestralidade africana. Para ele, as decisões refletem “o racismo estrutural que ainda opera no país, inferiorizando e marginalizando pessoas pretas”. “Esse resgate da ancestralidade é uma forma poderosa de reescrever a narrativa, permitindo que as novas gerações se orgulhem da crença”, pontua.
A inspiração surgiu durante o Carnaval de Belo Horizonte em 2023, quando Danilo e sua família participaram de uma comissão de frente intitulada "Piiê, O Faraó Negro", premiada como a melhor daquele ano. Após se aprofundar na história de Piiê, ele e sua esposa decidiram que, se tivessem um filho homem, ele receberia o nome em homenagem ao líder africano.
O cartório local, inicialmente, questionou a grafia do nome, por conta da utilização de dois "ii". Danilo explicou que a escolha ia além de uma questão estética, envolvendo uma decisão familiar de resgate cultural e antirracista. Mesmo assim, a Justiça manteve a recusa ao registro, citando o risco de o nome causar constrangimentos futuros à criança.
‘Racismo escancarado’
Para o padre Mauro, que desenvolve trabalhos na luta pelos direitos das pessoas negras, a decisão é um “racismo escancarado”. “O que me ocorreu foi a violência que nossos antepassados, quando vindos da África, quando escravizados e torturados, recebiam nomes cristãos. A vergonha que deveria ser para eles de perder sua identidade”, analisa.
A reportagem questionou o cartório e a Vara de Feitos Públicos de Belo Horizonte sobre o caso e aguarda retorno.