ROMBO

Com dívidas de R$ 43 bi, Americanas entra com pedido de recuperação judicial

A empresa reclamou da atitude do banco BTG Pactual, que conseguiu um mandado de segurança na Justiça para bloquear R$ 1,2 bilhão

O Tempo
Publicado em 19/01/2023 às 16:35Atualizado em 19/01/2023 às 16:37
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Americanas teve rombo bilionário (Foto/Americanas/Divulgação)

A Americanas anunciou nesta quinta (19) que entrou oficialmente com o pedido de recuperação judicial. O total dos créditos listados nos documentos protocolados com o pedido de recuperação judicial soma, nesta data, aproximadamente R$ 43 bilhões. A petição foi enviada à 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro. Pela manhã, a empresa já havia publicado um fato relevante dizendo que a recuperação judicial poderia ser solicitada "nos próximos dias ou nas próximas horas", uma vez que tinha apenas R$ 800 milhões em caixa.

A empresa reclamou da atitude do banco BTG Pactual, que conseguiu um mandado de segurança na Justiça para bloquear R$ 1,2 bilhão na conta da empresa junto à instituição financeira, como forma de se precaver de um possível calote. Também o Bradesco reteve mais de R$ 450 milhões, segundo a própria Americanas. O Itaú é outra instituição que foi à Justiça nesta quinta para pedir que a Americanas só possa sacar seu dinheiro após autorização judicial.

O pedido de recuperação judicial acontece oito dias após o ex-presidente da empresa, Sergio Rial, assinar um fato relevante, no último da 11, em que revelava a existência de R$ 20 bilhões em "inconsistência contábeis" no balanço da varejista, verificados até o terceiro trimestre do ano passado. Os resultados financeiros da companhia referentes ao ano de 2022 estavam previstos para serem divulgados no próximo dia 29 de março.

Os R$ 20 bilhões estão relacionados à operação de "risco-sacado", ou "forfait", em que a companhia contrata instituições financeiras para fazerem o pagamento adiantado de fornecedores. A varejista assume a obrigação de pagar o banco, com juros, dentro do prazo combinado com fornecedores. Esse prazo, segundo apurou a Folha de S.Paulo, sempre foi muito mais estendido do que a média do varejo: 180 dias, ante 90 do habitual.

De acordo com fontes do mercado, a Americanas não incluía na sua contabilidade os juros dessa operação que deveria pagar aos bancos, o que tornava os seus resultados melhores do que realmente eram e, consequentemente, o valor das suas ações. Junto com o anúncio do escândalo contábil, Sergio Rial informou que estava deixando a presidência da companhia, assim como o ex-diretor de relações com investidores da empresa, André Covre, para se tornar conselheiro dos acionistas de referência, os bilionários brasileiros à frente do fundo de investimentos 3G Capital– Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, que até o final de 2021 eram os controladores da empresa.

João Guerra, ex-diretor das áreas de tecnologia e recursos humanos da varejista, assumiu o comando da Americanas interinamente. Rial deu início à negociação com os bancos, que se indignaram com os indícios de fraude nos balanços. Temendo que seu crédito ficasse retido com os bancos, a Americanas entrou na sexta, 13, com um pedido de tutela de urgência cautelar junto à 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. Com isso, a empresa conseguiu impedir, pelo menos temporariamente, que seus ativos fossem bloqueados a pedido de credores.

A medida irritou em especial o BTG, que entrou com uma petição na Justiça para derrubar a liminar, chamando o trio dos principais acionistas de "fraudadores que dão ‘uma de maluco’". Segundo o banco, a Americanas adota uma "narrativa canhestra e disléxica", que "distorce por completo os limites e a finalidade do instituto da recuperação judicial, conferindo proteção legal, inclusive em caráter antecipado, a alguém que se tornou insolvente sponte propria [por vontade própria] por ter fraudado o mercado de crédito e o mercado de ações."

Para evitar o desgaste de Rial —um ex-banqueiro, que comandou o Santander Brasil e se mantém como presidente do conselho de administração do banco—, e impedir conflitos de interesse, uma vez que o Santander é um dos credores, a Americanas chamou o banco Rothschild como interlocutor oficial para a renegociação de dívida local e internacional. As conversas não evoluíram. Além de BTG e do Bradesco, outros bancos entraram na Justiça na tentativa de receber os valores devidos. Sem caixa, sem crédito na praça, a empresa decidiu, finalmente, fazer o pedido de recuperação judicial.

LEIA A ÍNTEGRA DO FATO RELEVANTE, ASSINADO PELO PRESIDENTE INTERINO DA EMPRESA, JOÃO GUERRA:

"A Americanas S.A., em atendimento ao disposto na Resolução CVM nº 44, de 23 de agosto de 2021, vem informar aos seus acionistas e ao mercado em geral que, na data de ontem, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em decisão monocrática em Mandado de Segurança impetrado pelo Banco BTG contra decisão proferida pela Décima Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que, dentre outras matérias, concedia à Companhia o direito de reaver valores compensados por credores nos termos da decisão cautelar proferida pelo Juízo da 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A decisão do Órgão Especial determina, ainda, o bloqueio do valor de cerca de R$ 1,2 bilhões em conta do Banco BTG até a apreciação do Mandado de Segurança.

Adicionalmente, na presente data, a posição de caixa disponível à Companhia para suas atividades alcançou o valor de R$ 800 milhões, sendo que parcela significativa deste valor estava injustificadamente indisponível para movimentação pela Companhia na data de ontem.

Por conta disso, embora ainda não tenha sido decidido, a administração está trabalhando com a possibilidade de, nos próximos dias ou potencialmente nas próximas horas, aprovar o ajuizamento, em caráter de urgência, de pedido de recuperação judicial, nos termos da Lei nº 11.101/05 e do art. 122, parágrafo único, da Lei nº 6.404/76.

A Americanas é uma varejista centenária, que presta um serviço amplo à população e tem um compromisso social forte de levar produtos acessíveis aos seus 53 milhões de clientes. A companhia vai recorrer da decisão, que fere seu esforço na busca por uma solução de curto prazo com os seus credores, para manter seu compromisso como geradora de milhares de empregos diretos e indiretos, amplo impacto social, fonte produtora e de estímulo à atividade econômica, além de ser uma relevante pagadora de tributos. A Companhia manterá seus acionistas e o mercado em geral atualizados acerca dos assuntos objeto do presente Fato Relevante." (DANIELE MADUREIRA/Folhapress)

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