Ministério de Portos e Aeroportos cobra das companhias aéreas um plano para redução dos preços das tarifas, enquanto busca formas de viabilizar um programa de descontos nas viagens para aposentados, pensionistas e estudante
Quem pretende viajar de avião neste fim de ano e ainda não comprou as passagens aéreas pode preparar o bolso. Após baterem recorde em 2022, os preços voltaram a subir em 2023. Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a tarifa média foi de R$ 644,5 no ano passado - valor R$ 113 mais caro que o de 2021. E em 2023, o preço médio já está em R$ 649,17.
“As pessoas que queriam viajar neste fim de ano já compraram os pacotes de viagem há muito tempo. Quem chega aqui na agência agora procurando viagens para o Réveillon se assusta com os preços das passagens. Eu mesmo comprei um pacote em abril para viajar em janeiro”, explica Carlos Simões, proprietário da agência de turismo Mais Cursos e Viagens.
Os preços das passagens dispararam no segundo semestre deste ano. Em outubro, a alta foi de 23,7%, após os valores já terem subido 13,4% em setembro, segundo dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), indicador usado para medir a inflação oficial do país. No acumulado do ano, as passagens aéreas subiram 13,53%.
E enquanto as passagens estão mais caras, os custos das companhias aéreas estão mais baixos. O querosene de aviação (QAV), que representa 50% das despesas das empresas, caiu 6% nas distribuidoras na sexta-feira (1º), após anúncio da Petrobras. Em 2023, o preço do QAV acumula uma redução de 19,6% na comparação com o valor cobrado no ano passado.
Em busca de uma solução para o problema do preço das passagens, o ministro de de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, convidou representantes das principais companhias aéreas do país - Latam, Gol e Azul - para uma reunião no último dia 14 de novembro. Na ocasião, o ministro deu dez dias para as empresas apresentarem um plano de redução dos preços das passagens.
O prazo acabou e as companhias pediram mais tempo para avaliar a situação, ganhando mais 14 dias. O governo está firme na discussão e defende que as empresas reduzam os preços das passagens aéreas sempre que a Petrobras também diminuir o valor do querosene de aviação.
Se o QAV está mais barato, por que as passagens estão mais caras?
As companhias aéreas alegam que o setor passa por uma grave crise desde o início da pandemia de Covid-19, em 2020. Segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), as companhias deixaram de arrecadar R$ 21,4 bilhões apenas no primeiro ano de crise sanitária.
Mesmo no momento mais grave da doença, 47 milhões de brasileiros embarcaram em voos nacionais em 2020. Em 2019, um ano antes da crise sanitária, 104 milhões de pessoas foram transportadas em voos domésticos.
O Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA) também relata outros motivos que provocaram esse aumento dos valores das passagens nos últimos anos. “O preço foi fortemente impactado por conta da pandemia, da desvalorização do real frente ao dólar e do conflito na Ucrânia, resultando no aumento do preço do petróleo”.
E apesar da queda de 19,6% no preço do querosene de aviação neste ano, as empresas aéreas alegam que o combustível ainda está muito caro com a alta acumulada dos últimos anos.
“O querosene de aviação (QAV) acumula alta de 118% na comparação com o ano de 2019 e hoje representa mais de 50% dos custos totais das empresas, que por sua vez têm uma parcela de cerca de 60% dolarizada. De 2016 a 2021, as empresas aéreas acumularam prejuízo de R$ 41,8 bilhões, segundo dados da ANAC. Além disso, o setor herdou dívidas milionárias que foram geradas durante a pandemia, quando foi deflagrada a maior crise de sua história”, diz o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias.
Mas na visão de Carla Beni, economista e professora de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a situação não é bem assim. Segundo ela, os preços das passagens não estão caindo porque a procura está muito alta. Os brasileiros ainda estão vivendo o período pós-pandemia, buscando viajar mesmo pagando mais caro porque ficaram praticamente três anos “presos” na cidade onde moram.
“Como há muita demanda por passagens, por que as companhias aéreas vão reduzir os preços? As pessoas voltaram a viajar, os congressos estão extremamente ativos, têm eventos no Brasil inteiro. Eu sou testemunha disso. Toda semana, às 6 horas da manhã, o aeroporto de Congonhas (em São Paulo) está lotado, há filas de 20 pessoas para poder tomar um café. Então qual é a sinalização do setor? Que tem demanda para isso”, explica a professora.
Para Carla Beni, as pessoas com menor poder aquisitivo perderam as condições de viajar de avião após a crise sanitária e vão optar por outros meios de transporte. Ela acredita que quem tem mais dinheiro vai continuar comprando passagens aéreas, mesmo mais caras, e a classe média também continuará pagando o valor mais alto, mas dividido no cartão de crédito. "A pandemia acentuou as desigualdades sociais".
Programa Voa Brasil
Enquanto o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, cobra das companhias aéreas um plano para o barateamento dos preços das passagens, o governo federal ainda tenta lançar o programa Voa Brasil, anunciado em junho pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o objetivo de oferecer viagens aéreas a R$ 200 para passageiros que se enquadrarem nos requisitos.
Estas pessoas poderiam comprar até quatro passagens por ano em condições especiais. No entanto, ainda não há uma data para o lançamento do programa.
“É importante ressaltar que a proposta do Voa Brasil é estimular viagens aéreas com bilhetes de até R$ 200 para públicos como aposentados, pensionistas e estudantes ligados a programas de financiamento federais. A expectativa do Ministério de Portos e Aeroportos é que cerca de 5 milhões de CPFs que não viajam passem a voar a partir dos descontos oferecidos pela iniciativa.Tão logo haja novidades em relação ao programa Voa Brasil, daremos ampla divulgação”, destacou o Ministério de Portos e Aeroportos, em nota.
Histórico do setor aéreo
O valor das passagens aéreas era regulado pelo governo federal até o início dos anos 2000. “Esse controle de preços dava uma certa estabilidade para o consumidor, mas aquilo ali gerava uma certa ineficiência, havia uma discussão de que as empresas não eram estimuladas a investir porque os preços eram controlados. Em 2001, as empresas passaram a ter liberdade para cobrar essas tarifas”, lembra Carla Beni.
Como não havia mais esse controle de preços, o governo federal decidiu criar a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) em 2005 para fiscalizar a operação das companhias aéreas.
“Nós tivemos após esse período um aumento de investimentos, uma expansão do setor, ampliação da malha aérea e isso fez com que os preços das passagens acabassem caindo, levando os brasileiros a viajarem mais. Em 2010, ocorreu aquela situação em que era mais barato viajar de avião do que de ônibus”, destaca a economista da FGV.
Segundo a professora, o setor teve algumas oscilações para cima e para baixo até 2020, quando começou a pandemia e a crise da aviação civil, que o setor considera a pior de toda sua história.
O que dizem as companhias aéreas sobre os preços das passagens?
Azul
"A Azul esclarece que os preços praticados variam de acordo com alguns fatores importantes, como trecho, sazonalidade, compra antecipada, disponibilidade de assentos, entre outros. Fatores externos, como a alta do dólar, o preço do combustível e conflitos internacionais também são elementos que influenciam nos valores das passagens. Importante destacar que o combustível representa cerca de 40% dos custos da aviação e é um dos mais caros do mundo".
Latam
"A LATAM Airlines Brasil informa que a precificação do setor aéreo é dinâmica em todo o mundo, e considera diversos fatores para oferecer a cada cliente o produto mais adequado, de acordo com a demanda de cada perfil de passageiro. Os preços das passagens variam de acordo com uma série de fatos, tais como compra antecipada, preço do combustível, sazonalidade, origem e destino do voo.
A LATAM recomenda ao cliente programar as suas viagens e adquirir as suas passagens com antecedência para encontrar os preços mais atrativos. É possível encontrar as melhores tarifas domésticas no Brasil de 6 a 2 meses antes do voo pretendido. No caso de viagens ao exterior, esta antecedência gira em torno de 8 a 4 meses. A companhia ainda ressalta que realiza diversas promoções ao longo do ano, que são divulgadas oportunamente. Os clientes podem acompanhar as promoções da companhia nas suas redes sociais oficiais".
Gol
A Gol também foi procurada pela reportagem, mas ainda não respondeu. Quando responder, esta reportagem será atualizada.
Fonte: O Tempo