O vinho e as tradicionais uvas da mesa da ceia de Natal podem ficar mais caros este ano no Brasil. Isso porque a produção mundial de vinhos pode cair a seu nível mais baixo desde 1961, de acordo com a Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV). Com produção baixa e alta demanda, o preço tende a subir. De acordo com levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis (Ipead) da UFMG, o vinho tinto nacional registra um aumento de 9,52% em Belo Horizonte. E, segundo o técnico de campo em viticultura pelo Senar, Wesley Erlan Palhão Barbosa, em relação ao ano passado, o preço do vinho pode subir até 50% no Brasil.
Wesley explica que as condições climáticas adversas interferiram muito na produção de uvas, principalmente no Brasil. “O frio desregulado afeta muito. É imprescindível, na época do inverno, a uva acumular horas-frio. Cada cultivar demanda um tempo, mas algumas uvas de mesa precisam de quase 200 horas a 7 graus Celsius para quebrar a sua dormência, que é quando a gente executa a poda. Só que nesse ano não teve frio no inverno. Foi um inverno quente, então isso afeta diretamente a produção de qualquer uva em qualquer região”, explica Wesley.
Essa baixa oferta, principalmente em uma época em que cresce a demanda por vinhos e uvas in natura devido às festividades de fim de ano, pode aumentar o preço do produto consideravelmente. “É cerca de 30% a 50% a mais do que era do ano passado”, afirma Wesley.
Além disso, essa escassez no fim do ano também tem relação com uma colheita prematura. O técnico explica que os produtores de vinho se preparam para colher a uva mais próximo de dezembro, só que, neste ano, as condições climáticas atrapalharam o cronograma.
“Por esse ano ter sido muito quente e ter tido seca severa, as uvas anteciparam o ciclo fisiológico. A floração chegou muito cedo e encerrou rápido. E teve muito abortamento por causa do excesso de calor. Algumas regiões já estão muito quentes. Então tem produtor que planejou colheita no final de dezembro e já colheu toda a uva”, explica. “A uva que era para demorar, aí, quatro ou cinco meses para colheita, está sendo colhida em três ou quatro meses”, cita.
E essa condição afeta não só produtos nacionais como internacionais também. Segundo a OIV, no Chile, maior produtor da América do Sul, espera-se uma queda de 15% em relação a 2023 e de 21% em comparação com a média dos últimos cinco anos. O que, segundo Wesley, certamente afeta a importação desses produtos no Brasil.
“Lá é a mesma situação. É inverno fora de época, desregulado, secas, primavera fazendo retardar a colheita. A primavera acabou se prolongando demais, então, pega uma janela curta de descanso da videira. Então, vamos dizer assim, o mercado interno vai ficar caro, e a importação de vinho vai ficar mais cara ainda”, pontua.
Chuvas em Minas
O excesso de chuvas em meados de abril foi o suficiente para que as parreiras de uma vinícula em Capitólio, no Sul de Minas, fossem atacadas por um fungo. Segundo José Magid, sócio-proprietário da Vinícola Quinta do Carcará, a produção, que crescia com otimismo, caiu pela metade.
O pesquisador, que investiu nesse ramo há pouco tempo, conta que, em 2022, a primeira safra de vinhos da vinícola, com 753 garrafas, chegou a ser premiada em um concurso da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A segunda safra, em 2023, chegou a 1.300 garrafas. E o projeto, que começou com a ideia de 1.000 parreiras, saltou para 6.500 em 2024. Mas a doença freou esse crescimento.
“Nós tivemos um problema seríssimo de oídio, que é um fungo que ataca e mofa a baga da uva, esse fungo ataca a superfície da baga, ela endurece e, quando cresce, racha a baga, e expondo a semente e o caldo, e realmente não serve para a produção”, explica.
Apesar da intempérie, a produção foi suficiente para conseguir lançar essa safra em junho de 2025. “Tudo na vida tem um pouco de compensação, né? Como foi pouca uva, parece que o vinho ficou ainda melhor”, brinca. Segundo José, no caso da vinícola, a baixa produção não vai interferir no preço da garrafa.
Vinho em Minas
Pesquisador na área há muitos anos, José Magid vê Minas Gerais com grande potencial para a produção de vinhos e, principalmente, para o desenvolvimento do enoturismo – turismo voltado ao consumo e apreciação de vinhos. E essa visão é expressada no vinho produzido pela Quinta do Carcará. “Nós não temos pretensão de botar vinhos em supermercado. O nosso negócio, a nossa pretensão, é explorar o que está crescendo muito no estado, que é o enoturismo”, afirma.
“A gente não quer só vender o nosso vinho, a gente quer não só encantar o consumidor com o nosso vinho, mas também que ele se encante com o nosso vinho aqui em Capitólio. A gente quer que ele se encante com a paisagem, com os passeios, curta diferentes opções de hospedagem”, sintetiza.
Vale lembrar que, em agosto, o governo de Minas assinou um protocolo de intenções para a estruturação e criação da Rota dos Vinhos. A iniciativa visa impulsionar a expansão do setor de vinicultura, que contempla a produção de vinhos, e a vitivinicultura, para o produtor que também produz uvas in natura além da bebida.
O documento foi assinado entre o Governo de Minas - via Secretarias de Estado de Cultura e Turismo (Secult) e de Desenvolvimento Econômico (Sede), Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge), Sebrae Minas e a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), por meio do Instituto Euvaldo Lodi (IEL).
O enoturismo também passará a ser o foco de uma política pública para atrair visitantes e investimentos, além de gerar emprego e renda.
A ideia é que a iniciativa da Rota dos Vinhos contemple oito regiões: Zona da Mata, Triângulo Mineiro, Sul/Sudoeste, Oeste, Norte, Metropolitana, Jequitinhonha, Central e Campo das Vertentes.
Fonte: O Tempo