Morre um poeta. Apaga-se uma luz. As palavras, cintilantes em seus versos, congelam-se no frio da morte. Nunca mais. Nunca mais novos versos, outras palavras. Palavras. A massa, o barro do poeta. Sem elas o poeta não é nada. Sem ele, as palavras vagam incultas, nuas, ásperas. Ocas. Sem sentido. Sem significado. Só ele lhes dá vida, infunde calor e ânimo. Move-as. Articula-as. Sem ele, jazem imobilizadas. Per-ple-xas. Não passam de palavras tão-somente. Em suas mãos, transformam-se em mágica, lume e guia. Com ele vagueiam soltas, lépidas, límpidas. À beira de rios, lagos e mares. Mares. A massa líquida, volátil, informe. Como palavras distanciadas do poeta ausente. Palavras. Palavras. O que fazem sem o poeta? Nada. Apenas existem. Hirtas, inúteis. Aliás, úteis para tudo e todos. Aí sua perdição. Sua danação irremediável. Tal utilidade as desvaloriza. Para sempre e permanentemente. Só o poeta infunde-lhes a utilidade da inutilidade. Dá-lhes forças, vigor. Outorga-lhes sentido. Concede-lhes um destino. Erige-lhes um significado. As palavras passam a ter valor, sentido e significado por si mesmas. Em si mesmas. Não pelo que contêm. Mas pelo que são. Som e sentido. Som, principalmente. Ou unicamente. A beleza do belo. Nada mais esfuziantemente belo e sofrido do que a palavra. A palavra do poeta. A palavra da poesia. Nela se contém o universo. Da beleza. Útil porque bela. Bela porque inútil para tudo o mais que não seja produzir beleza. E poesia. A morte do poeta a deixa órfã, desamparada, soluçante. Nunca mais novos versos. A força e o vigor do verbo. O verbo feito poesia e beleza. O verbo feito humano. O humano feito verbo.
Guido Bilharinho
Advogado em Uberaba e editor das revistas culturais eletrônicas Primax (Arte e Cultura), Nexos (Estudos Regionais) e Silfo (Autores Uberabenses)