I
Pressupõe-se que todo cidadão ao almejar, por meio de eleições, ocupar cargo público no Legislativo e no Executivo esteja imbuído de espírito público e pretenda exercê-lo para trabalhar para o bem comum e para o progresso e o desenvolvimento de seu Município, Estado ou Nação.
Constitui regra geral que esse cidadão não se abalança a enfrentar campanha eleitoral para ocupar apenas uma única vez o posto para o qual se candidatou. Isso ocorre excepcionalmente, geralmente por desilusão com o sistema eleitoral e administrativo vigente.
A regra, pois, é que todo candidato queira fazer carreira política, galgando cargos cada vez mais importantes ou, quando menos, pleiteando sempre a recondução para a mesma função, normalmente a Legislativa.
Contudo, mesmo que persuadido dos melhores propósitos, esse cidadão, candidatando-se, terá não só de secundarizar as atividades privadas, prejudicando muitas vezes seus rendimentos, como assumir gastos com a campanha eleitoral sem nem ao menos ter a certeza de ser eleito.
Ou seja, o candidato terá de pagar – e antecipadamente – para tentar ocupar função pública que deverá (ou deveria) ser exercida para o bem de todos, sendo o único cidadão que paga para trabalhar (e antecipadamente).
Só que, face aos gastos cada vez mais volumosos das cada vez mais sofisticadas e caras campanhas eleitorais, o eleito, nem bem empossado, além de ter de pagar dívidas contraídas na campanha, tem de se preocupar (e, pior, ocupar) com os gastos da próxima campanha.
Todavia, como os eleitos exercem cargos plenos de poder, geralmente obtêm contribuições que os comprometem (e os submetem) aos desígnios dos patrocinadores, pelo que de paladinos do bem comum forçosamente transformam-se (ou já se originam) em defensores de pretensões particulares, mesmo que legítimas, mas, que deveriam ser atendidas pelas vias regulares.
O eleito é pautado, pois, no exercício do ofício público pelos gastos de campanhas eleitorais e necessidade de fazê-los e pagá-los, tornando-se isso, pois, sua única preocupação ou, pelo menos, a preocupação preponderante e que irá nortear e caracterizar sua atuação, secundarizando, quando não totalmente defenestrando, o interesse público.
Dessa engrenagem não há escapatória, já que mesmo os candidatos mais populares não se eximem de gastos eleitorais.
Esse quadro afasta da política os cidadãos munidos dos melhores propósitos, mas, que não possuem recursos e nem aceitam submeter-se ao guante dos financiamentos eleitorais privados, restringindo-se, pois, o direito democrático de todos poderem se candidatar a cargos públicos preenchidos por meio de eleições. Daí advém, que o SISTEMA atual, em regra, afugenta da política cidadãos dotados dos requisitos indispensáveis ao exercício de função pública, impedindo-os de se candidatarem, ou impõe distorção e desvio desse exercício, que é o que vem ocorrendo no Brasil de maneira generalizada.
A medida, não para solucionar de vez a questão, transformando num passe de mágica o que aí está, já que, como se sabe, não há organização eleitoral e partidária perfeita, mas para alterar profundamente esse quadro inexpressivo, desprezível e inoperante, quando não e também corrupto, é a adoção do fundo eleitoral, no qual os gastos das campanhas são bancados pelo erário público.
II
O financiamento público das campanhas eleitorais com a criação do fundo eleitoral, para ter o alcance necessário, deve, no entanto, ser normatizado por regras rigorosas, que garantam sua eficácia, dentre elas, avultando:
1 − Gestão e aplicação desses recursos exclusivamente pela Justiça Eleitoral, nunca pelos partidos ou pelos candidatos;
2 − Proibição de gastos eleitorais pelos partidos e candidatos, mesmo que sejam com haveres próprios;
3 − Apresentação (gravada ou ao vivo) em rádios e TVs apenas dos próprios candidatos expondo e defendendo programas e ideias, vedada toda apelação de marketing, cenas externas e presenças de terceiros;
4 – Horários de rádio e TV idênticos para todos, visto que a atual legislação que os distingue fere o caput do artigo 5º da Constituição Federal, dispondo que “todos são iguais perante a lei, sem distinção (sic) de qualquer natureza”;
5 − Proibição de realização e distribuição de material propagandístico de qualquer natureza pelos candidatos, partidos e por quem quer que os apoiem;
6 − Impedimento da, já de si inconstitucional, publicidade pública pelo menos nos dois anos anteriores às eleições, independentemente de vir a ser ou não candidato à reeleição o titular de mandato, a não ser excepcionalmente com autorização da Justiça Eleitoral e dentro dos estritos permissivos constitucionais;
7 − Comícios sobre palanques (móveis ou fixos), fornecidos e controlados pela Justiça Eleitoral em convênio com as prefeituras, realizados em lugares previamente designados, disponibilizados gratuitamente e em igualdade de condições a todos os candidatos e partidos;
8 − Instalação pela Justiça Eleitoral em determinadas praças públicas ou outros lugares adequados de painéis, nos quais constarão nomes, fotos, cargos pleiteados, siglas partidárias de todos os candidatos, constituindo, por sua vez, a única matéria permitida para publicação e divulgação pela Justiça Eleitoral em jornais, revistas e internet, nunca pelos candidatos, partidos e apoiadores.
Além de outras providências, restritivas e/ou necessárias (na área da internet, por exemplo), as elencadas acima, mesmo parecendo à primeira vista, sob a permissiva ótica nacional, por demais rigorosas, constituem a única maneira de se democratizar as eleições, permitindo o acesso às disputas eleitorais de cidadãos idealistas que estão alijados das que se ferem sob a atual legislação, que submete o processo eleitoral e os mandatos ao poder econômico face à necessidade de recursos para custeio das caras campanhas eleitorais.
À evidência, que essas medidas, para sua plena efetivação, exigirão também alterações nas leis de constituição partidária, já que os partidos atualmente não passam de feudos dirigidos autocraticamente por suas cúpulas.
Enfim, como afirmou o escritor João Guimarães Rosa, não adianta mudar os jogadores se não se alterar as regras do jogo.
Na organização atual, nem adianta eleger um ou outro bom candidato, porque dados os sistemas partidário e eleitoral vigentes, eles não passarão de minorias que nada poderão fazer. Ao contrário, eles e seus eleitores a estarão avalizando e legitimando para continuar tudo como está, ou seja, no pior dos mundos.
Por fim, sem adoção dessas providências e de outras correlatas e do regime parlamentarista não há a mais remota possibilidade de se governar o país como necessário e indispensável.