Descoberto o crânio de Luzia em Minas Gerais. Estimaram cientificamente que viveu há mais de 12.000 anos. Então, podemos considerar que 100 anos é um átimo para a natureza. Suprimida a humanidade por qualquer causa, certamente em menos de cem anos a natureza se restabelece plena em harmonia. Afinal uma árvore não leva cem anos para crescer. Enfim, nossa vida, antevista para menos de cem anos, é, na verdade, um piscar de olhos nesse contexto. Todavia, mesmo assim, ousamos sustentar o orgulho e a arrogância, além de agirmos como fisicamente eternos. Foi nesse cenário que um nobre humilhou um pobre, seu submisso, com palavras ferinas para menosprezá-lo. Mas o pobre se fez altivo e respondeu ao nobre. “– Não demora estaremos iguais, empatados, tal qual. Seremos pó.” Não tardou muito, talvez por ironia da existência, dois cortejos fúnebres se cruzaram num entroncamento de vias, confluência também do destino. O daquele homem pobre, que, pelas convenções profanas, cedeu passagem ao do outro, rico, aliás, só por isso dito nobre. Um marchava rumo ao cemitério dos abastados, lado oposto ao dos plebeus. Aquele nobre, coincidentemente, morreu no mesmo dia daquele pobre. Seguiram seus rumos, cada qual para sua sepultura. No sepultamento do nobre, muita gente e pouca emoção. Na verdade, murmurava-se em clima de herança e sucessão. No enterro do pobre havia emoção, mas também nada que alterasse a definição. Ambos na sina do pó. Afinal, do pó vieram e a ele retornavam. A arrogância e a mágoa foram enterradas juntas, com eles, na brevidade fugaz do viver. Sem arrependimento e sem perdão, remédios para purificação. Daí em diante, não se sabe no que se transformou o pó que se tornaram. Todavia, para o pó há explicação científica. Mas para onde foi a Alma de Luzia?