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A armadilha de Tucídides

Marcos Bilharinho
Publicado em 12/06/2024 às 19:39
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A “Armadilha de Tucídides” se constitui em uma expressão cunhada pelo cientista político norte-americano Graham Alisson, que aponta o inevitável conflito bélico entre uma potência econômica dominante contra uma emergente.

Tucídides foi um general e historiador grego, que nasceu no ano 460 a.C. e faleceu em 400 a.C., autor da obra “História da Guerra do Peloponeso”, travada entre Esparta e Atenas entre 431 a.C. e 404 a.C., em que Esparta se sagrou vitoriosa.

Um exemplo da ocorrência dessa precisão se verificou com as “Guerras Púnicas” decorrentes dos conflitos entre Roma e Cartago, que se desdobraram na Primeira Guerra Púnica, que se desenvolveu de 264 a.C. até 241 a.C.; na Segunda, que transcorreu entre os anos de 218 a.C. até 201 a.C., e na Terceira e última, que se desenvolveu de 149 a.C. até 146 a.C., com o aniquilamento total de Cartago.

No início da Primeira Guerra Púnica, Cartago tinha superioridade naval sobre Roma, levando-a a dominar o Mar Mediterrâneo, controlando, assim, as rotas comerciais marítimas da região.

Um dos modelos de navios mais avançados dos cartagineses era o Quinquerremes, que se constituía em uma embarcação de guerra, que continha cinco filas de remos manejados por cinco remadores por remo.

Porém, os romanos conseguiram obter um exemplar dessas embarcações e, aplicando a engenharia reversa, tomaram ciência do sistema de construção desses navios, conseguindo, a partir daí, desenvolverem uma marinha que conseguiu rivalizar com a de Cartago e tomar o controle do Mediterrâneo e da Sicília.

Evidentemente, os povos sempre procuraram manter em segredo seus materiais bélicos e, também, os seus produtos comerciais, já que a atividade mercantil produtiva é indispensável à criação, evolução e manutenção do poderio militar de qualquer nação.

Se a ocorrência de situações que confirmam a “Armadilha de Tucídides” não é inédita, nunca se observou o que se deu com a iniciativa dos EUA, a partir de 1980, de transferir unidades de produção para a China. Com o objetivo de diminuir seus custos, várias empresas foram transferidas para a China, que, lembrem-se, nos anos de 1980 tinha uma economia menor que a do Brasil.

Registre-se que o restabelecimento de laços diplomáticos entre os dois países remonta ao governo Richard Nixon/Henry Kissinger (1969-1974). Todavia, essa aproximação visou, principalmente, agravar o cisma sino-soviético.

Hoje, por exemplo, a maior fábrica da Apple é localizada em Zhengzhou, em um amplo campus de propriedade da empresa taiwanesa Foxcom. Ademais, a grande maioria dos modelos da Nike é fabricada na China. Ou seja, a Nike tem fábrica na China e a maioria dos seus produtos vem de lá, sendo que a maior indústria da Tesla fora dos EUA se localiza em Shanghai.

Essa política de desindustrialização norte-americana, que visava apenas atender aos anseios imediatos de empresas privadas, ignorou os interesses da sociedade norte-americana como um todo, deprimindo a capacidade de consumo de seus cidadãos ao “exportar” os empregos junto com as fábricas.

Essa política dos EUA foi fundamental para que o PIB chinês ultrapassasse o norte-americano em Paridade de Poder de Compra – PPC, sendo que o PIB industrial chinês é de, aproximadamente, 4 trilhões de dólares e o norte-americano é de 2 trilhões de dólares, de acordo com o grande economista Paulo Gala.

Apesar de os EUA deterem a maioria das patentes, Taiwan produz 90% dos semicondutores mais avançados do planeta, os denominados nanochips, produzidos pela empresa Taiwan Semiconductor Manufacturing Company, conhecida pela sigla TSMC, criada com apoio do Estado, que é a maior fabricante de semicondutores do mundo, sediada na cidade de Hsinchu.

No entanto, antevendo o abismo que se avizinha, o governo de Joe Biden reinaugurou uma política industrial agressiva, aliada uma guerra comercial, com o objetivo de tentar recuperar a capacidade industrial norte-americana e a competitividade da economia daquele país, especialmente, na denominada fronteira tecnológica.

Todavia, ao contrário da iniciativa Nixon/Kissinger, a política norte-americana recente uniu a Rússia, potência militar, com a China, potência econômica emergente, com a guerra da Ucrânia, que, na realidade, se constitui em um conflito “por procuração” que envolve os Estados Unidos/Europa versus Rússia/China.

Só nos resta esperar que a “Armadilha de Tucídides” não se realize em sua plenitude, pois os efeitos de uma guerra termonuclear entre essas potências, levada ao seu paroxismo, também serão inéditos e devastadores para todo o planeta.

 Marcos Bilharinho

Advogado e escritor

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