O celular tocou e cantarolou e dos meus sonhos distantes me arrancou. Mesmo seu toque sendo uma música de qualidade duvidosa de uma banda alemã, eu tenho certeza que a ouvi dizendo, enquanto me agarrava com força pelos braços e pernas: “Acorda, acorda, Balconista”. Acho que preciso de um médico.
O que posso dizer sobre meu domínio enquanto Balconista? Na minha opinião, é um ofício comum, no qual tenho controle de três “boletas” giratórias em uma grade, que nas lendas soam impenetráveis, e nelas vendo soluções mágicas que prometem em seu excesso te relaxar da sua semana cansativa de trabalho e ainda servir de consolo amoroso. Contudo, muitos vão dizer que apenas trabalho em um Disk Bebidas e que toda a minha fantasia não passa de um trote mental devido ao fim de expediente. Acho que esqueci de acordar.
Digno de diálogos de uma mesa de bar no interior de Pernambuco, aqui você encontra de figurões a pessoas comuns, que, quando passam do cotidiano “Bom-dia”, “Mais alguma coisa?” e “Obrigado”, geram histórias ou risadas atrás dos freezers.
Um desses contos, que gosto de chamar de Bonificação, inicia-se com quase metade do expediente, juntamente com a chegada de mais cliente. Muitas vezes, quando a visão externa da grade não se resume a uma horda de compradores e carros estacionados, aparecem nela algumas pessoas dispostas a conversar, e esse dia era um desses. O rapaz veio buscar uma bebida, se não me falha a memória, suponho que era Amstel, e com isso nos contou seu causo e sua revolta: Ele e seus colegas de trabalho haviam sido bonificados em função de uma meta passada pela empresa, que rendeu os misteriosos milhões que quase ninguém nunca viu na vida. Contudo, essa recompensa, que era esperada no mínimo com um acréscimo no salário ou a ida a um restaurante, foi resumida a um bombom para cada um dos funcionários. De início, eu achei graça de sua revolta, achei cômico que meses de trabalho árduo e esforço foram resumidos a um chocolate de 20 gramas. Mesmo assim, achei uma ação justa do chefe desse rapaz; ganhar um milhão como prêmio? Nem todo mundo gosta de milho, imagina um desses em tamanho família.
Vendo por outro lado, acho que esse caso seria um belo exemplo da tal “Mais valia” do tal do Marx, mas, como não entendo muito, vou deixar essa dúvida no “acho”. Vixe, preciso me apressar. Já estão me chamando: “Balconista! Balconista! Seu intervalo acabou”.
Hebert Júnior
Balconista