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Quixotes e moinhos de silício

Bruna de Araujo Rossetti
Publicado em 22/02/2025 às 10:57
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Nos vastos campos da modernidade, a Inteligência Artificial ergue-se como o mais novo moinho de vento. Um moinho imenso, complexo, alimentado não pelo vento, mas por bilhões de linhas de código, algoritmos e servidores em nuvem. Assim como Dom Quixote, cada nação veste sua armadura e, empunhando a lança da inovação, avança na esperança de domar essa força titânica.

Os Estados Unidos, na figura de um cavaleiro experiente, acreditam-se herdeiro legítimo do trono tecnológico. É o Quixote original, romântico e visionário, que vê na IA uma extensão de sua grandeza e poder. Aventureiro, lidera suas tropas do Vale do Silício, convencido de que sua visão moldará o futuro. Em seu cavalo Rocinante, rebatizado de OpenAI, Google e Microsoft, investe em utopias digitais, imaginando um mundo onde máquinas o servirão com lealdade inquestionável.

Ao lado, porém, surge a China, Sancho Pança que, ao contrário do escudeiro humilde do romance, também busca ser cavaleiro. Com olhos pragmáticos, enxerga a IA não como um sonho distante, mas como um instrumento poderoso para fortalecer seu império. Não há ilusões de cavalaria: para a China, cada moinho representa um território a conquistar, cada algoritmo, uma espada afiada para a supremacia. Com empresas como Tencent e Baidu, cavalga veloz, traçando planos de dominação que unem estratégia e determinação fria.

E assim, nessa nova cavalaria digital, ambos os Quixotes - o romântico e o pragmático - lançam-se em batalhas travadas em terras invisíveis: redes neurais, nuvens de dados e simulações quânticas. No entanto, os moinhos são implacáveis. Eles giram a uma velocidade impossível de prever, movidos por forças maiores que a vontade dos cavaleiros: a complexidade dos sistemas, o dilema ético, o medo e o poder sem limites que a IA oferece.

Mas o destino de Quixote e Sancho ainda está aberto. Será que a visão romântica dos EUA triunfará, transformando a IA em uma nova forma de democracia e liberdade? Ou será que a disciplina calculista da China moldará um futuro mais autoritário, mas imbatível em eficiência? Talvez, como na obra de Cervantes, ambos acabem descobrindo que os verdadeiros gigantes não são os moinhos de vento, mas as ilusões que projetaram sobre eles.

No fim, Dom Quixote nos lembra que lutar contra moinhos de vento não é apenas uma metáfora para o impossível — é um lembrete de que a grandeza e a loucura muitas vezes caminham lado a lado. E assim, EUA e China, com suas lanças digitais, continuam sua corrida, sem saber ao certo se estão cavalgando para a glória ou para uma nova forma de delírio moderno.

 Bruna de Araujo Rossetti

OAB/MG 216.235

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