DEMISSÃO

Denúncia de desvio de emendas derruba ministro das Comunicações de Lula

Vera Rosa/Rayssa Motta/Victor Ohana/Agência Estado
Publicado em 09/04/2025 às 11:16Atualizado em 09/04/2025 às 13:36
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'Acusações que me atingem são infundadas', diz Juscelino em carta de demissão (Foto/Reprodução)

'Acusações que me atingem são infundadas', diz Juscelino em carta de demissão (Foto/Reprodução)

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), pediu demissão nesta terça-feira, 8, após ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF), sob acusação de desvio de emendas parlamentares. Juscelino disse que não quer criar constrangimento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sairá antes de a Corte apreciar a acusação, a primeira do procurador-geral, Paulo Gonet, contra um integrante do primeiro escalão de Lula.

Antes de viajar para Tegucigalpa, capital de Honduras, onde participará hoje da 9.ª Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), Lula conversou com Juscelino por telefone e disse que gostaria de falar com ele pessoalmente. No início da tarde, o presidente falou novamente com o ministro e, na ligação, pediu que apresentasse a carta de demissão. Lula afirmou que era melhor ele se concentrar na sua defesa.

Horas depois, Juscelino fez o que Lula mandou. "Hoje (ontem) tomei uma das decisões mais difíceis da minha trajetória pública Solicitei ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva meu desligamento do cargo de ministro das Comunicações", afirmou Juscelino em sua carta de demissão.

O União Brasil indicou o líder do partido na Câmara, deputado Pedro Lucas Fernandes (MA), para o lugar de Juscelino. O assunto foi tratado durante almoço ontem entre Juscelino, Fernandes, a ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT) e os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (AP), e do União Brasil, Antônio Rueda, além do ministro do Turismo, Celso Sabino (União Brasil). Alcolumbre e o deputado Elmar Nascimento (BA) - ambos do União Brasil - foram padrinhos da indicação de Juscelino.

Em conversas reservadas, interlocutores de Lula já afirmavam que a situação de Juscelino era insustentável e aguardavam sua demissão. O petista virou refém de seu próprio discurso porque disse, no ano passado, que o auxiliar seria afastado caso fosse alvo de acusação do Ministério Público Federal.

Quando era deputado, Juscelino destinou emendas parlamentares à prefeitura de Vitorino Freire, no Maranhão, cidade que era administrada por sua irmã Luanna Rezende.

Estrada

A Polícia Federal já havia indiciado o ministro em junho do ano passado. A investigação, instaurada a partir de reportagens do Estadão, apontou suspeitas de recebimento de propinas em troca da destinação dos recursos e do direcionamento de contratos a certas empresas. Em janeiro de 2023, o jornal revelou que o ministro, no cargo parlamentar, destinou recursos do orçamento secreto para asfaltar uma estrada na cidade que passava pela fazenda da sua família.

O inquérito tramita no Supremo. O processo é sigiloso e físico. O ministro Flávio Dino é o relator do caso na Corte. Cabe a ele encaminhar as conclusões da PGR para votação na Primeira Turma, após ouvir a defesa. Na sequência, os ministros vão decidir se há elementos suficientes para abrir uma ação penal.

A denúncia foi oferecida a partir da Operação Benesse, fase ostensiva da investigação instaurada em setembro de 2023. Na ocasião, a irmã de Juscelino foi afastada da prefeitura de Vitorino Freire. As conclusões da PF, porém, não vinculam a atuação da PGR, que tem autonomia para analisar as provas e decidir sobre a acusação formal.

Codevasf

Os recursos destinados por Juscelino foram transferidos à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e, na sequência, foram parar na prefeitura comandada pela irmã.

Loteada pelo Centrão, a Codevasf operou a distribuição de verbas do orçamento secreto. Pelo menos quatro empresas de amigos, ex-assessoras e uma cunhada do ministro ganharam mais de R$ 36 milhões em contratos com a prefeitura de Vitorino Freire.

Em maio, uma auditoria interna da Codevasf concluiu que houve irregularidades em obras realizadas em Vitorino Freire com recursos indicados por Juscelino. A conclusão se deu após a análise de dois contratos que totalizam R$ 8,988 milhões e tratam da estrada do ministro e outras ruas da cidade maranhense A auditoria também constatou pagamentos indevidos para empresa contratada para as obras.

Por meio de nota, os advogados Ticiano Figueiredo, Pedro Ivo Velloso e Francisco Agosti, que representam Juscelino, disseram que ele "reafirma sua total inocência" e que o oferecimento da denúncia "não implica culpa".

Reforma

Lula tem sido aconselhado a agir rápido para evitar mais desgaste ao governo, mas resiste a tomar qualquer decisão antes de conversar com Juscelino, a quem sempre elogiou por avaliar que ele defende sua administração. A nova crise atinge o Planalto justamente em um momento de queda de popularidade do presidente. Há no PT a expectativa de que Lula aproveite mais uma etapa da reforma ministerial, nos próximos dias, para substituir Juscelino junto com outros auxiliares.

Até agora as trocas se resumiram a ministérios comandados pelo PT. O publicitário Sidônio Palmeira entrou na Secretaria de Comunicação Social (Secom) no lugar de Paulo Pimenta e Gleisi Hoffmann, então presidente do partido, assumiu a cadeira antes ocupada por Alexandre Padilha na Secretaria de Relações Institucionais, que cuida da articulação política do Palácio do Planalto com o Congresso. Padilha, por sua vez, substituiu Nísia Trindade no Ministério da Saúde.

É possível que a dança das cadeiras, agora, também atinja o PSD de Gilberto Kassab, secretário de Governo na gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) em São Paulo, além do União Brasil e de mais quadros do próprio PT.

Centrão

O novo imbróglio bate à porta do União Brasil no momento em que o partido negocia uma federação com o PP do senador Ciro Nogueira (PI), um arranjo que pode dar ainda mais musculatura para o Centrão no Congresso.

Nos últimos tempos, denúncias também atingiram o empresário baiano José Marcos Moura, que integra a cúpula do União Brasil e ficou conhecido como "Rei do Lixo".

'Acusações que me atingem são infundadas', diz Juscelino em carta de demissão

Em sua carta de demissão, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), negou as acusações da Procuradoria-Geral da República e disse que provará sua inocência no Supremo Tribunal Federal (STF). "As acusações que me atingem são infundadas, e confio plenamente nas instituições do nosso país, especialmente no Supremo Tribunal Federal, para que isso fique claro. A justiça virá", escreveu ele.


"Hoje tomei uma das decisões mais difíceis da minha trajetória pública. Solicitei ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva meu desligamento do cargo de ministro das Comunicações. Não o fiz por falta de compromisso, muito pelo contrário. Saio por acreditar que, neste momento, o mais importante é proteger o projeto de país que ajudamos a construir e em que sigo acreditando."

Juscelino também disse que nunca teve "apego ao cargo", mas que mantinha "paixão pela possibilidade de transformar a vida das pessoas". Segundo ele, a perspectiva agora é de se dedicar à defesa no processo. "A decisão de sair agora também é um gesto de respeito ao governo e ao povo brasileiro. Preciso me dedicar à minha defesa, com serenidade e firmeza, porque sei que a verdade há de prevalecer", diz a nota oficial.

Ele afirma ainda no comunicado que retomará o seu mandato de deputado federal pelo Maranhão. "Saio do Ministério com a cabeça erguida e o sentimento de dever cumprido", escreveu. Em seguida, fez agradecimentos a Lula, ao partido e ao seu Estado.

O presidente do União Brasil, Antonio Rueda, afirmou em nota que "respeita o gesto" de Juscelino e que "a iniciativa demonstra responsabilidade e compromisso com a transparência".

Em nota, os advogados Ticiano Figueiredo, Pedro Ivo Velloso e Francisco Agosti disseram que Juscelino "reafirma sua total inocência" e que o oferecimento da denúncia da PGR "não implica culpa".

'Factoides'

"Como deputado federal, no mandato anterior, Juscelino Filho limitou-se a indicar emendas parlamentares para custear a realização de obras em benefício da população. Os processos de licitação, execução e fiscalização dessas obras são de competência exclusiva do Poder Executivo, não sendo responsabilidade do parlamentar que indicou os recursos", diz a nota.

"Essa é a melhor oportunidade para se colocar um fim definitivo a essa maratona de factoides que vem se arrastando por quase três anos, com a palavra final da instância máxima do Poder Judiciário nacional", afirmam os advogados.

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