No ano de 2012, a professora Vera Lúcia Cavalcanti de Sá, de 68 anos, natural da cidade de Salvador, recebeu notícias opostas que tiveram um grande impacto em sua vida.
Nessa época, Vera estava frequentemente rouca e já estava em tratamento com um otorrinolaringologista para refluxo. Esse problema estava mascarando o crescimento de um carcinoma em sua laringe.
Outros sintomas começaram a surgir, como a sensação de um nó na garganta, dificuldade para engolir e uma tendência a engasgar facilmente.
Um dia, após tossir sangue, a professora decidiu procurar o pronto-socorro do Hospital Santa Izabel, em sua cidade. Os médicos recomendaram a realização de uma broncoscopia. Em fevereiro daquele ano, ela recebeu o diagnóstico de câncer na laringe.
O tumor foi descoberto em estágio avançado, no estágio quatro. Vera Lúcia, ex-fumante há oito anos naquela época, recusou-se a fazer a cirurgia. Ela conta: "Tive que assinar um documento, porque não queria passar por uma operação e ser mutilada. Os médicos queriam remover minha laringe, faringe... Optei por seguir em frente com o tratamento. Fiz cinco sessões de quimioterapia, 32 sessões de radioterapia e mais duas de quimioterapia, e fui considerada livre da doença no mesmo ano. Após cinco anos, recebi alta definitiva. Na terceira sessão de quimioterapia, o tumor já havia diminuído em 80%. Não precisei fazer a cirurgia e não perdi minhas cordas vocais, onde o tumor estava localizado."
Além de realizar exames anuais, atualmente a professora pratica exercícios físicos, cuida de sua alimentação e não consome álcool nem tabaco.
Normalmente, a rouquidão é associada a causas mais simples, como gripes, resfriados, refluxo, uso inadequado da voz, poluição, estresse ou ansiedade. No entanto, especialistas afirmam que essa alteração na voz não deve ser subestimada ou negligenciada.
A rouquidão é o principal indicativo de câncer na laringe, uma doença cinco vezes mais comum em homens, que são mais expostos ao tabagismo e ao consumo de álcool. Esse tipo de câncer é predominante em pessoas acima dos 40 anos.
O oncologista Artur Malzyner, do Hospital Albert Einstein e membro da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, explica: "Essencialmente, o tumor de cabeça e pescoço, e especificamente o da laringe, é a principal causa conhecida de rouquidão."
Malzyner também aponta que os cânceres de pulmão e do mediastino também podem causar rouquidão prolongada. Ele afirma: "Se a rouquidão persistir por mais de duas semanas, é um alerta; se persistir por mais de um mês, é absolutamente necessário procurar um especialista."
O Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima que, a cada ano do período de 2023 a 2025, ocorrerão cerca de 7.790 novos casos de câncer na laringe no Brasil, sendo 6.570 em homens e 1.220 em mulheres. Esses números correspondem a um risco estimado de 6,21 novos casos para cada 100 mil homens e 1,09 para cada 100 mil mulheres.
Carlos Santa Ritta, médico e vice-coordenador da Comissão de Cabeça e Pescoço da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), afirma: "Se as pessoas prestarem atenção a um simples sintoma como a rouquidão, isso já poderia aumentar exponencialmente as taxas de diagnóstico precoce no país. O ideal é que qualquer pessoa que apresente uma alteração persistente na voz procure um especialista, como um fonoaudiólogo ou otorrinolaringologista."
Se a rouquidão persistente já pode indicar uma lesão nas pregas vocais, é importante que seja avaliada por meio de um exame de videolaringoscopia. Quanto mais cedo for feito o diagnóstico, maior será a probabilidade de preservar a laringe.
Outros sintomas do câncer de laringe incluem tosse seca e constante, escarro com sangue, dificuldade para engolir alimentos ou sensação de algo preso na garganta, dor de garganta ou de ouvido persistente, caroço no pescoço e perda de peso.
Malzyner explica: "Ocasionalmente, pode haver dificuldade respiratória. O ar entra pelo nariz ou pela boca e passa pela laringe até chegar aos pulmões. Se a laringe estiver estreitada devido ao crescimento de um tumor, isso pode afetar a capacidade respiratória do paciente."
Thiago Bueno de Oliveira, oncologista clínico e presidente do Grupo Brasileiro de Câncer de Cabeça e Pescoço (GBCP), alerta que o uso de qualquer forma de tabaco (cigarro, cachimbo, charuto, narguilé, cigarro de palha, cigarro eletrônico) é um hábito cancerígeno. Ele acrescenta: "Além disso, assim como o tabagismo, o consumo de bebidas alcoólicas também aumenta a probabilidade de desenvolver câncer na laringe. E o risco aumenta exponencialmente quando esses dois fatores são combinados."
Manter um peso saudável e adotar uma alimentação equilibrada, com ênfase em frutas, legumes e verduras, também são formas de prevenir a doença.
O câncer de laringe corresponde a aproximadamente 25% dos tumores malignos que afetam a região da cabeça e do pescoço. Além de evitar tabaco e álcool, assim como controlar o peso, os cânceres de cavidade oral podem ser evitados com uma boa higiene bucal, o uso de preservativos no sexo oral e a vacinação contra o HPV.
As estimativas do Inca para cada ano do próximo triênio (2023-2025) indicam cerca de 41 mil novos casos de câncer de cabeça e pescoço.
A taxa de mortalidade dos cânceres de boca e laringe é alta, especialmente no Brasil, onde os diagnósticos costumam ser tardios. Se tratados em estágio inicial, esses tumores têm 90% de chance de cura. O problema é que 80% dos pacientes já estão em estágio avançado no momento do diagnóstico e início do tratamento.
(Folhapress/Patrícia Pasquini)
Principais sintomas
Laringe
Cavidade oral
Fonte: O Tempo